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Kaio

 

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31 julho 2010

Cinco Anos! - parte 1

Racio Símio começou em 31 de Julho de 2005, com um post desajeitado, mas (é duro admitir...) que refletia o Kaio daquela época. Vejam que engraçado: era um sujeito cuja auto-afirmação baseava-se nos seguintes pontos: "é o melhor da sala em notas, é representante de classe, é socialista, curte bandas de Rock antigas, nunca namorou, adora política, nunca vai em festas e baladas, madruga na internet, lê livros clássicos (Admirável Mundo Novo, Dom Quixote, Revolução dos Bichos, etc.) e detesta coisas da moda pelo simples fato de serem comerciais demais, capitalistas demais, consumistas demais".

O que mudou e o que continuou desde então?
Posso já ter tido um namoro, gozar atualmente de uma vida social/noturna bem mais agitada, ser libertário e não mais implicado (mas apenas indiferente e seletivo) em relação às "coisas da moda". Por outro lado, eu ainda participo ativamente de grupos estudantis, tenho um ótimo rendimento acadêmico, permaneço um fã de Rock clássico e sou aficionado por política e literatura.
Porém, não é sobre esta continuidade ou aquela ruptura de que estou falando. É mais do que isso. Será que ainda penso como o Kaio F. aos 15 anos de idade?

Vejamos o que o post do primeiro aniversário pode nos trazer para elucidar isso. Segundo o texto, em apenas 1 ano de existência o blog "cobriu uma época muito importante da minha vida, como o crescente ceticismo quanto à política (mesmo sendo ela uma das minhas maiores paixões, eu já nem ligo mais para "identificações" com correntes ideológicas), uma paixão-relâmpago, a expansão do meu gosto musical, novos amigos virtuais, crises existenciais, um egocentrismo irritante, entre outras coisas."
Já devo ter dito isso várias vezes por aqui, mas de fato aquele período foi psicologicamente um dos mais conflituosos da minha vida. Abalei algumas certezas (ex.: a confiança no socialismo e a impossibilidade de me apaixonar por alguém depois de tantos anos). Isolei-me em alguns aspectos (durante um breve período, até escrevi poesia) e abri-me mais ao mundo em outros (comecei a sair mais). Desiludi-me um pouco com o colégio em que estudava (e com o Ensino Médio como um todo) e tive atitudes rebeldes - com as devidas proporções! -, desnudando uma crise de fé em valores que antes eu tinha por fundamentais. Defini, contudo, os cernes de minha identidade musical e política, que se mantêm até hoje (libertarianismo e indie rock). A curto prazo, o saldo foi negativo, mas hoje vejo aqueles 12 meses como decisivos para quem me tornei hoje.

O que veio em seguida recuperou minha atitude otimista. Apesar de algumas megalomanias (fundei minha própria escola filosófica, o Anfisismo) e decepções (outra paixão-relâmpago), o segundo ano coberto por RS, como demonstra este post, foi bem mais alegre. Voltei a ler compulsivamente, adquiri um equilibrado ritmo de estudos, fui ao show do New Order em SP, fiz boas amizades virtuais e na vida real... e até passei no vestibular (pena que meu colégio não me liberou...)!
Tudo indicava que uma utopia que eu tinha desde criança estava se concretizando: aos 17 anos, eu chegaria a um momento incrível de minha vida. Vejam o seguinte trecho: "Tudo vem ocorrendo de acordo com as minhas pretensões, e minha auto-confiança e força de vontade esmagaram supostos sofrimentos pelos quais eu teoricamente passaria nesta reta final de minha adolescência. De fato, o 17º ano de minha existência vem revelando ser tão fantástico quanto eu desejava que fosse."

Quando o blog completou 3 anos, eu estava nos últimos meses desse "apogeu". O post curto, citando a letra de "Racio Símio" (Titãs), tem suas razões: eu estava em plena ABCP (inclusive 4ª feira vou para a nova edição deste encontro nacional de cientistas políticos), portanto sem tempo de fazer um texto mais elaborado. Após (ou, se você acredita na ideologia do "Yes Stress": apesar de) um segundo semestre em que li, escrevi (e fiz!) tudo o que eu queria, finalmente entrei na universidade no início de 2008. Morar sozinho foi uma mudança maravilhosa na minha vida (notem o contraste disso com os versos: "Mamãe eu quero mamar / Eu não tenho onde morar / Moro aonde não mora ninguém", hehe), constituindo um dos pilares da autonomia e independência que comecei a adquirir a partir de então. O mundo universitário trouxe novidades: fui em boas festas, fiz colegas, discordei dos comunistas quanto à invasão da reitoria e continuei a ter experiências literárias formidáveis.

Porém, o que veio dali em diante não foi tão sensacional assim... Querem um sinal disso?
Sequer mantive a tradição de escrever um post de aniversário! Aliás, fiquei três meses sem escrever no blog (de 1º/7 a 4/10). A falta de produtividade tem um certo motivo: eu estava namorando, e não era um relacionamento dos mais adoráveis e tranquilos. Não sei se por azar ou fraqueza da minha parte, mas o fato é que minha estréia em "relationships" foi desagradável. Nada contra a pessoa em questão, porém o período em que estivemos juntos não foi bom para nenhum dos dois lados. Até acho que o fim dessa história (30/10) foi tardio, e tenho minha parcela de culpa nisso. Ao invés de tristeza, sinto alívio por não ter nenhuma lembrança boa daqueles meses; afinal, assim não fico lamentando ou sentindo saudades, certo?
O período entre os julhos de 2008-09 teve, algumas semanas antes, (mais) uma paixão-relâmpago. Além disso, logo no início, na ANPOCS, houve um abalo no meu individualismo arrogante. Por outro lado, consolidei minhas amizades na UnB e entrei no PET, hoje um grupo tão importante para mim. Enfim, será que foi tudo uma praga - ou consequência - daquele show do Muse em que desmaiei de fome, rs?

E então, o que houve nos últimos 9 meses que pode ser relatado como "marxianidades e tocquevillidades" em meu interior e exterior?
É o que vocês conferirão no próximo episódio! To be continued.

30 julho 2010

Centelhas

Desde o último sábado, quando revi A Batalha de Abel, voltei a me viciar em Os Cavaleiros do Zodíaco. Percebi que, embora eu saiba a história de cabo e rabo, tenha visto umas cem vezes cada um dos 4 primeiros filmes e possuía todos os 48 mangás, não cheguei a assistir a todos os episódios do anime. You Tube serve para essas coisas, rs. Hoje à noite, por exemplo, revi os episódios da luta trágica entre Hyoga e Isaac.

Um pouco antes, teve colóquio sobre Musashi. Foi ótimo! Meu amigo apresentou muito bem, e despertou em todos um maior interessa pela cultura dos samurais e do código de conduta dos mesmos (Bushido).

Hoje à tarde, cheguei em Brasília bastante resfriado. Ainda não sarei... Vamos ver se muita vitamina C e o Sorine que meu pai me deu vão resolver alguma coisa. Ah, conheci a nova rodoviária da cidade. Achei-a linda; tem o estilo e o amplo espaço de um aeroporto. E, pasmem, há um Bob's por lá! Para quem estava acostumado com a decadente e mal-conservada Rodoferroviária, foi uma boa novidade.

Ontem à noite, fiz uma viagem-relâmpago para Goiânia. Assim que acordei, fui retirar meu certificado de reservista (até que enfim! Semana que vem estourava o prazo...) e, pouco depois, eu e minha mãe pegamos o ônibus para a capital.

Neste fim-de-semana, preciso terminar de ler Nozick e corrigir logo os fichamentos de TPC. Time is running out!

29 julho 2010

Máquina do Tempo: 5 textos de RS

Já que depois de amanhã é aniversário do blog, resolvi recomendar a (re)leitura de 5 textos que, embora alguns deles sejam de qualidade duvidosa, representam as várias maneiras como eu argumentei e expus minhas idéias em Racio Símio. Divirtam-se.
- A Entropia da Liberdade (agosto/2007): quem diria que eu, hoje um sujeito que duvida do status de cientificidade da Ciência Política e que fica profundamente indignado com as tentativas das Humanidades de imitarem as ciências naturais e exatas, já recorri (mesmo que metaforicamente) à Química para legimitar meus valores políticos. Até que ponto este esforço foi poético ou acabou descambando para uma "filosofia da história"?
- Selvagemente ambicioso? (novembro/2009): após terminar meu primeiro namoro, quis provar para mim mesmo que ela não havia sido uma paixão tão grande quanto outras 4 (ou 5) "platônicas". Foi um esforço nick-hornbiano, mas que a longo prazo não foi em vão. De fato, hoje, quando penso no assunto, percebo que meu 1º relacionamento não foi (ou ficou) como uma grandiloqüente e trágica desilusão, mas apenas como um período de 5 meses desgastante, permanentemente instável e não muito romântico. Porém, meu primeiro insight sobre o assunto foi mais no sentido de (re)separar utopia de realidade. A "garota ideal" voltou a ter vida própria, perdendo a conexão com o concreto.
- Meia-idade na adolescência (fevereiro/2006): Eu no auge da minha arrogância semi-melancólica dos 15 anos de idade. O que, é claro, não quer dizer que mudei radicalmente desde então... A boa e velha auto-indulgência continua, embora com feições diferentes.
- Sartre, ó Sartre... o mundo não é mais o mesmo (novembro/2006): texto longo e com comparações e analogias exageradas, uma espécie de "adeus" daquele Kaio de 16 d.M. Em breve, eu entraria em uma fase mais serena, porém ainda egocêntrica.
- A Magia da Montanha (julho/2008): resenha do meu livro favorito, e tema da minha pesquisa e, possivelmente, monografia. Não há muito o que comentar; dos textos citados, deve ser o menos exaltado e problemático.

28 julho 2010

Sicko

Há tempos que eu não ficava tão adoentado assim. Tudo bem que minha conduta favoreceu este cenário catastrófico: acordei às 4h15 para estudar para a prova de Análise Política fazendo exercícios e preparando resumos tresloucadamente. Tomei Coca-Cola gelada (e sem gás!) seguida de café quente, lavei o cabelo (mesmo estando com frio), só saí da kit às 7h50, correndo desesperado para pegar um ônibus e chegar na UnB a tempo. Cheguei atrasado na prova (8h15), e terminei aos "44 do 2º tempo". No almoço, tomei bebidas geladas.
Resultado? Corpo dolorido, garganta seca, pescoço quente (isso é sintoma de febre, certo?), desânimo, cansaço... Nem sei como ainda topei ir com um amigo para o debate de Planaltina, só para saber, quando estávamos no meio do caminho, que ele havia sido cancelado. Para não perder a viagem, ainda passamos em algumas sala de aula e conversamos com um pessoal da chapa 1 que estava por lá.
Espero que eu melhore rápido... Vou dormir bastante (e bem agasalhado!) para acordar renovado amanhã.

A seguir, as considerações finais da Aliança pela Liberdade no debate de ontem. Eu e um colega meu dividimos a fala. Notem o quanto eu falo rápido, haha.

27 julho 2010

Good Vibrations

Serei breve, porque amanhã precisarei acordar bem cedo (talvez 4h15) para estudar para a prova de Análise Política. Pois é, procrastinei tanto que cheguei a este ponto: ter que madrugar no próprio dia da prova para pôr a matéria em dia. Bem feito!

Como sempre, a aula de Sociologia do Conhecimento (Gusmão) foi ótima. Estamos discutindo "Imposturas Intelectuais", obra em que Alan Sokal analisa e desmascara as farsas e excessos dos filósofos pós-modernos. O professor, mais uma vez, foi didático e descontraído. De longe, a minha matéria predileta neste semestre.
À tarde, tive aula de Introdução à Filosofia, talvez a mais inspiradora até agora. Falamos do diálogo de Sócrates e Diotima sobre o amor em "O Banquete" (Platão): a questão de que ele não é posse, mas imortalidade; sua relação com a fecundidade; a definição do amor como procura do que não se tem e está além (o Bem); seu lado daimon e filósofo (intermediário entre a sabedoria e a ignorância) etc. A professora expôs o tema de forma agradável e intimista, de forma que até 'cold hearted people' como eu sentiram-se tocados.

O primeiro debate entre as chapas que estão concorrendo ao DCE e aos RDs foi ótimo. Embora eu estivesse bem ansioso antes de ele começar, ele foi bem mais tranquilo do que o esperado. Nenhuma das chapas (mesmo as de extrema-esquerda!) levou para o lado pessoal ou coisas do gênero; foi uma discussão civilizada, em que a Aliança pela Liberdade deixou claras as suas propostas e diferenças em relação ao resto do movimento estudantil. Enfatizamos, por exemplo, a excelência acadêmica, a importância das fundações de apoio, o policiamento no campus, a crítica à pressa de alguns grupos pelo Congresso Estatuinte, e por aí vai.
Mal posso esperar pelo debate de amanhã, em Planaltina.

26 julho 2010

The Dark Side of Sophia

Eu sou muito cauteloso com qualquer coisa que me soe a "culto", "seita", "ocultismo". Não gosto de nada que invoque gnosticismo ou qualquer outra doutrina que fale em "divinização da sociedade" (os Ivan Karamázov da vida, hehe). Afinal, se não sigo religiões há 7 anos, preciso ter um mínimo de coerência, e também não me ligar a grupos esotéricos. Acredito que eu seja um livre-pensador, com influências - e predileções - pelo Libertarianismo (política/economia) e pelo Humanismo (artes/filosofia). Além disso, mesmo que eu ainda seja um 'baby intelectual', procuro me apoiar naquilo que é consensualmente tido por canônico, clássico; enfim, os grandes livros e autores do Ocidente (é uma delimitação deliberada, afinal, a vida é curta e não sei se terei tempo e paciência para estudar o pensamento oriental).
Sou tão temeroso que, mesmo ouvindo quase todos os dias o curso de História da Filosofia de Olavo de Carvalho (em meu celular-mp3, no caminho para a UnB), sou bem cético quanto a algumas de suas afirmações. Sua exaltação da revelação do cristianismo, por exemplo, não me convenceu. Também não levo muito a sério o lado mais politizado de Olavo, que tende ao conspiracionismo, mesmo que vez ou outra acerte em suas delações (a existência do Foro de S. Paulo, por exemplo; aliás, Índio da Costa foi sensato ao associar o PT com as FARC). Porém, concordo com boa parte de suas críticas à filosofia (e sociedade) moderna (s), e admito que ele tem um estilo expositivo interessante.

Minha inspiração para esse texto foi a Nova Acrópole. Lembram-se que ontem eu estava bastante interessado pela "escola", e até pensava em fazer um curso por lá? Pois bem, hoje à tarde perguntei para um professor meu que tem muito interesse por Filosofia o que ele sabia ou achava da N.A. Um colega meu que estava ouvindo a conversa imediatamente disse: "Não vale a pena, Kaio! Já estudei lá, e posso lhe dizer: é uma seita! O discurso é humanista, mas pregam o relativismo religioso" Meu prof. corroborou, falando que eles têm fama de esotéricos.
Hoje à noite, resolvi pesquisar mais sobre eles na internet, e o que li não foi nada animador. Os podres do fundador, as ligações de Blavatsky (uma pensadora muito citada na palestra que vi ontem) com o ocultismo, relatos de "lavagem cerebral" e "táticas de guerrilha", símbolos suspeitos e por aí vai.
O mais curioso é que ontem mesmo eu tive alguns indícios de que a Nova Acrópole não cheirava bem. Na hora pensei que era apenas exagero de minha parte, mas hoje as peças se encaixaram. Não tomem isso como evidências, mas apenas impressões e desconfianças:

1 - A palestrante não parava de sorrir, de uma maneira assustadora, e falando em uma linguagem que, embora clara, era espalhafatosa. Além disso, no máximo 25% da fala dela foi sobre os Cavaleiros do Zodíaco, o resto foi propaganda da escola e pregação anti-cristã (sutil, diga-se de passagem), ode ao aperfeiçoamento humano e críticas ao materialismo. Quando eu fiz uma pergunta/comentário sobre a temática da depressão (Seiya, A Batalha de Abel), ela respondeu algo que tinha pouco a ver, sobre síntese do conhecimento e tal;
2 - A secretaria também era excessivamente sorridente, e tinha um discurso muito na ponta da língua para soar espontâneo;
3 - O imenso sucesso da organização pelo mundo inteiro, com uma disseminação veloz no próprio DF (já são 10 sedes!) me deixaram meio "encucado", pois é difícil de acreditar que tantas pessoas se interessam realmente por filosofia;
4 - A maioria dos temas que eles estudam, por mais que insistam em falar que é filosofia "à maneira clássica", pouco me pareciam ter a ver com os grandes debates filosóficos. Algumas coisas, como o próprio festival de desenhos animados em que fui, até que são interessantes, mas a maioria das discussões soam como "vamos enfiar filosofia oriental e auto-ajuda em tudo que der!" Procurem um encarte deles e vocês entenderão o que quero dizer.
5 - A ênfase em filosofia prática e trabalho voluntário causou-me estranhamento, na medida em que essa história de "aprender fazendo" não era o que eu esperava de uma genuína escola filosófica, por mais que isso seja um preconceito elitista da minha parte.

Depois de tudo isso, nem pretendo voltar lá nessa semana para conhecer o curso. Ganho mais lendo os textos para o GEH e o PET.

Em off: a campanha eleitoral já começou na UnB! Visite o Blog da Liberdade para conhecer mais sobre a chapa 5, a Aliança pela Liberdade.

25 julho 2010

Trilha

Semana que vem, o blog completa 5 anos. Sendo assim, comprometo-me (ih, senta que lá vem história, rs...) a escrever durante todos esses próximos sete dias, ou sobre meu cotidiano ou sobre a saga de Racio Símio.

Comecemos por um breve relato do meu fim-de-semana. Viajei para Goiânia, para em seguida eu, minha mãe e irmãos irmos a Anápolis, para a formatura da irmã do meu melhor amigo. A despeito da (péssima) idéia de colocar uma banda de covers ecléticos ao invés de um DJ, o baile foi bacana. Voltei para Brasília hoje à tarde, a tempo de conhecer a Nova Acrópole. Fui a uma palestra sobre Filosofia em Os Cavaleiros do Zodíaco. Foi ótima! Gostei muito da escola, pois eles têm uma proposta profundamente humanista, de real "amizade pela sabedoria". Estou até pensando em fazer o curso de filosofia à maneira clássica que eles oferecem. Só preciso ver a questão dos horários. Sexta à noite fica meio complicado; irei à aula inaugural, mas provavelmente vou esperar a abertura de uma turma nova nas quartas-feiras.

Nessa semana tem de tudo, inclusive debate das chapas (3ª), prova de Análise Política (4ª) e viagem-relâmpago para Goiânia (5ª-6ª). Tchau!

23 julho 2010

Pensées

Acabei de voltar de uma festa no CAHIS. Happy hour no subsolo! Discotequei por lá, em um set dos mais ecléticos: The Jam, Muse, New Order, The Cure, Lady GaGa, Kylie, Corona, The Who... e por aí vai!

Houve alguns problemas técnicos por lá (as caixas do som das bandas queimaram), mas no geral foi uma experiência boa. E ainda saí no lucro, pois voltei com meia garrafa de Coca-Cola 2L, rs.

O problema é que amanhã às 8h tenho reunião do "Et Moi Avec Ça?" (versão chique do nome do projeto de extensão com o qual o PET tem parceria) e às 10:00, discussão sobre Sam Huntington, "O Choque de Civilizações". Como se não bastasse, 1 da tarde pego carona para ir a Goiânia. Além de formatura da irmã do meu melhor amigo, preciso pegar o certificado de reservista - em Agosto estoura o prazo de 1 ano para retirá-lo!

"E aí, Kaio F., como vai a vida?" Muito bem, obrigado. Só fico assustado com o meu desprendimento quanto a relacionamentos. Nem parece que eu namorei durante metade do ano passado; estou até mais solteirão do que eu era antes, rs! Vou em festas e danço, bebo refrigerante, converso com meus amigos e danço mais um pouco... mas "investir" em uma garota, nope (no máximo, olhar/observar -> pensar "Ela tem namorado, ou tem 'peguete' ou é lésbica; isso se não for sem-graça" -> voltar a dançar de olhos fechados). Talvez isso seja mais normal do que eu penso. Afinal, a vida é mais do que pegar pessoas e namorar, certo? Nesse caso, "estoy de buenas". 2010 continua sendo um ano excelente para os estudos, a despeito do tempo cada vez mais apertado. Estou com umas 5 leituras acumuladas, e tenho que terminar pelo menos 3 delas na semana que vem!

Meu calendário está bem atribulado: debates eleitorais (a Aliança pela Liberdade concorrerá aos RDs, ao contrário das quatro outras chapas, que também disputarão o DCE), reuniões administrativas e acadêmicas do PET, iniciar a pesquisa sobre meu futuro tema de monografia, as atividades dos Estudos Humanistas (em Agosto, faremos pelo menos 6), ABCP na 1ª semana do mês, último mês de aula (a.k.a. leituras e provas finais)... Nossa, só de pensar já fico cansado.

O pior (ou melhor?) é que nem posso me dar ao luxo de cair na nostalgia e falar "Ah, que saudades do Ensino Médio", pois naquela época ainda havia o agravante de que 40% das coisas que eu estudava não eram interessantes (a maior parte das Exatas e Biológicas), e o colégio tinha uma rotina desgastante - em especial, as famigeradas "aulas extra", principalmente no 3º ano. Se há algo de que eu pudesse ter saudade, são justamente as coisas que estou, indiretamente, reeditando pelo GEH (e, até certo ponto, também pelo PET): Café Filosófico, Luzes da História, Multitemas, Painel de Notícias etc.

E quanto ao Ensino Fundamental? Também não. Com exceção da 7ª e da 8ª séries (anos em que eu me adiantei nos conteúdos e comecei a ler uma literatura e ouvir músicas de maior nível), foi um período de poucas preocupações filosófico-existenciais ou consciência socio-política. Em outras palavras: vida mansa. Game Boy, Cartoon Network (e, a partir de certa época, Warner e Sony), MSN, mangás de CDZ e por aí vai.

Ou seja, nem comparando com meu passado eu tenho o direito de reclamar da minha vida contemporânea. Tenho exatamente aquilo que eu sonhava antes de entrar na UnB, e espero que meus sonhos de hoje sobre como será o mestrado (o qual, cada vez mais, estou inclinado a fazer em Brasília mesmo) também se concretizem. Não que eu queira me gabar da algo, mas de fato estou fazendo justamente aquilo que quero da minha vida. Sem traumas nem neuras, e as angústias e problemas são raros.

Sinceramente, não sinto inveja de quem tem uma existência mais complexa, trágica e densa do que a minha. Tudo bem que, por um lado, isso me dá pouca "base empírica" para pensar coisas mais elevadas, deixando-me à mercê de duas fontes, os livros e amigos(as). Porém, acredito que estou aproveitando da melhor forma possível minhas limitações (e carência de dilemas profundos). Embora excessivamente cauteloso (vide minha vida social, do álcool ao "currículo de relacionamentos"), não creio que estou me abstendo dos pequenos prazeres.

Redigindo este texto, percebo o quanto preciso voltar a postar no blog. É uma experiência muito prazerosa! Chega de ficar resumindo meu dia em 140 caracteres, ou só usar Racio Símio para textos do GEH. Isto aqui precisa voltar a ser um diário com toques de divã, rs. Até a próxima.

22 julho 2010

Tocqueville e a Bastilha que caiu antes de 1789

(Ontem o PET/POL realizou a 1ª edição do Versus, atividade de Ensino na qual confrontamos as visões de dois autores sobre o mesmo evento histórico. Inauguramos com Marx vs. Tocqueville sobre a Revolução Francesa. O debate foi ótimo!
A seguir, o fichamento que preparei "para me preparar", rs.)

TOCQUEVILLE, Alexis de. “O Antigo Regime e a Revolução”. São Paulo: Hucitec, 1989.

1. Linhas gerais do pensamento de Tocqueville
- Nascido em 1805, “Tocqueville era um aristocrata por instinto e democrata por preferência intelectual. (...) Concebia a tarefa de historiador como ‘pedagogia da liberdade’; ou seja, uma visão histórica que privilegiasse o livre-arbítrio.” (Kramer).
- Para o autor, os hábitos influem no jogo das instituições políticas. Há uma ênfase na interdependência entre leis e costumes, talvez valorizando mais estes do que Montesquieu. Ampla valorização da liberdade política (virtude cívica), porque ela cria entre todos os cidadãos as relações necessárias e os laços mútuos de dependência.
- A sociedade democrática: é aquela em que “o objetivo principal de um governo de modo nenhum é dar a todo o corpo da nação a maior força ou a maior glória possível, mas fornecer a cada um dos indivíduos que a compõe a maior parcela de bem-estar e evitar-lhe maior miséria” (A Democracia na América).
- Liberdade e Igualdade: coexistem, mas em uma relação complicada, pois a igualdade é mais instintiva, enquanto que a liberdade é cultivada. Sendo assim, aquela é mais difícil de ser conquistada, mas uma vez obtida, é quase irrevogável; esta, porém, pode ser perdida num piscar de olhos. Por outro lado, um dos efeitos políticos da igualdade é justamente o amor à independência, o que favorece instituições livres. Estas são necessárias aos principais cidadãos para ensinar a eles os perigos que correm e aos cidadãos menores para garantir seus direitos.  
- Individualismo: sentimento refletido (ao contrário do egoísmo, que é instintivo) que leva os cidadãos a se isolarem da massa de seus semelhantes, restringindo seu círculo social a familiares e próximos. Com isso, há uma perda de virtude cívica, pois o indivíduo deixa de participar da vida pública para se dedicar apenas à sua busca pessoal por interesses materiais. “Aristocrático, Tocqueville sentia desprezo pelas classes médias, portadoras naturais desse individualismo” (Merquior).

2. O objetivo fundamental e final da Revolução

- A abolição dos privilégios. Mudar o governo e demolir a antiga forma de sociedade. A religião não era o verdadeiro alvo, mas sim as instituições sociais (incluindo a Igreja) que perpetuavam os problemas e desigualdades.

3. A obra peculiar da Revolução Francesa
- Consistiu em um esforço convulsivo e doloroso um processo já iniciado no Antigo Regime. Ultimo passo de uma série de mudanças que já vinham ocorrendo durante, no mínimo, todo o século XVIII.
- Tendência à homogeneização dos gostos, costumes e idéias foi selada. As pequenas barreiras criadas pelo individualismo, em substituição às distinções aristocráticas, eram facilmente derrubáveis. A separação das classes, ao criar distinções tributárias, facilitou a Revolução.
- Culpam injustamente a Idade Média por todos os males que as corporações industriais (privilégios) produziram. Ex.: superintendências, representantes das corporações.

4. A centralização administrativa como herança do Antigo Regime
- Conselhos, intendentes, subdelegados etc. assumem funções que, formalmente, cabiam à aristocracia. Eram quem expedia ordens “de facto”. O ócio e a isenção tributária dos nobres coexistiam com a crescente apropriação da administração pública pelo terceiro estado.
- Possui efeitos perniciosos: este poder único, central e de legislação uniforme pode vir a estabelecer um novo tipo de despotismo, mais suave e invasivo: degradaria os homens sem atormentá-los.

5. As conseqüências da revolução administrativa na política

- Antecedeu a Revolução Francesa uma profunda mudança na administração: os intendentes foram substituídos por assembléias locais, o que gerou uma disputa de poder. O intendente foi reduzido à impotência, mas deixaram-lhe subsistir; as assembléias, em meio a recriminações e consultas, tornaram as decisões mais lentas.

6. Outros fatores
- O papel dos filósofos: a intelectualidade (“homens de letras”) teve peso na criação de uma atmosfera revolucionária. Tinham apreço pelas teorias puras, pelas idéias gerais e abstratas. Sua condição social favorecia esta atitude contemplativa. Um detalhe interessante era que os próprios nobres, e não os burgueses, eram os leitores mais ávidos dos tratados que defendiam a igualdade social, o fim dos privilégios, os direitos humanos etc. Os livros tinham fornecido a teoria; ataque a todas as leis e apego às regras simples e elementares extraídas da razão (ao invés dos costumes e tradições, mais complexos).
- Como a nobreza, até o último instante, manteve suas regalias (não pagar impostos, p. ex.), o sentimento de injustiça aumentou gradualmente. Era uma atitude distinta da aristocracia inglesa, que sempre esteve em maior contato com as camadas populares, principalmente nas questões políticas e econômicas (“mudar sem destruir”).
- Tanto os nobres quanto os burgueses gozavam de pouca ou nenhuma liberdade política; a participação nos negócios públicos era pouco estimulada; por um longo período não houve reunião dos Estados Gerais.

7. Considerações finais
- Levando em consideração todos os fatores elencados, a derrocada da aristocracia era inevitável; porém, sem ela o despotismo encontraria quase nenhuma resistência. Sendo assim, a Revolução Francesa, além de inesperada para os seus contemporâneos foi cruel.
- A brandura das teorias e a violência dos atos: a Revolução foi idealizada pelas classes mais civilizadas e praticada pelas mais rudes.
- É nos tempos que antecedem a Revolução Francesa que devemos procurar as luzes capazes de iluminá-la. O dominador caiu, mas tudo que que havia de mais substancial em sua obra ficou de pé.

20 julho 2010

Filosofia e Religião em Evangelion

(ou: A Boa Nova de um melancólico demiurgo)

1. Introdução
- Neon Genesis Evangelion foi lançado em 1995. Foi criado e roteirizado por Hideki Anno, e o desenhista (e responsável pelo mangá) é Yoshiyuki Sadamoto. Anno havia se recuperado de 4 anos em que esteve em depressão clínica. O anime possui 26 episódios e 4 filmes (dois lançados à época, Death and Rebirth e The End Of Evangelion; dois mais recentes, iniciando a tetralogia Rebuild Of Evangelion); também foram publicados 12 mangás (série ainda não concluída).
- “A maior tragédia são os envolvidos no projeto”: as próprias pessoas empenhadas na criação da Evangelion apresentavam um considerável repertório de traumas, neuras e dramas pessoais. A depressão (falta de propósito existencial) talvez seja o tema principal de NGE.
- Obra simbolista: “Uma maneira espiritualizada, a procura do sublime, do além da consciência, uma maneira de fugir de realidade. Ao contrário de movimentos anteriores que fugiam da dor do Real, pela ‘morte’, o simbolista tem uma visão mais metafísica para a escapatória da dor de viver: A fuga da consciência.” Subjetivismo – impressão que o real o causa. Questionamentos existenciais.
- Segundo Impacto: desastre global que destruiu, direta (desequilíbrio ecológico, como a elevação do nível dos mares e o derretimento da Antártida) ou indiretamente (guerras civis), metade da população mundial. A retirada da Lança de Longinus (utilizada na crucificação de Jesus Cristo) de Adão foi mal-sucedida; ele só possuía o Fruto da Vida (e não ambos, este e o da Sabedoria), e perdeu o controle. A reintrodução da lança, apesar de ter gerado o anjo, impediu uma tragédia ainda maior – o aparecimento de outros anjos, que levariam a uma destruição completa.

2. Os Personagens
- Shinji Ikari: pessimismo à la Schopenhauer, “dilema do ouriço” (comportamento cauteloso e distante em relação às pessoas, com medo de se machucar, ter os sentimentos feridos). Masoquista, pois odeia tanto a si mesmo que gosta de fazer os outros também sofrerem. Não pilota o EVA por um senso de dever cívico ou por amor à humanidade, mas porque é tão fraco que deixa os outros tomarem as decisões por ele. Auto-menosprezo: indiferente a tudo, incapaz de reação. Depressivo, entra em colapso moral após a morte de Kaworu (cena da masturbação).
- Rei Ayanami: um robô com alma? Clone de Yui, a partir dos restos desta, que faleceu nos testes do EVA. Thanatos: desejo de morte (retornar ao nada como uma motivação). É a personagem mais inibida e introvertida, evitando ao máximo o contato humano. Porém, ao longo da série vai se “humanizando”.
- Asuka Soryu: esconde trauma (presenciou o suicídio da mãe) com arrogância e eficiência (ser sozinha e independente). Barreiras protetoras e agressivas. Quando são quebradas, seu quadro clínico é desvelado. É o primeiro passo para a cura de Asuka (episódio 25 alternativo).
- Misato Katsuragi: complexo de Electra, com uma identificação com a mãe a ponto de chegar ao desejo de possuir o pai. Entra na NERV com o intuito de vingar a morte de seu pai. Teve afasia durante dois anos, depois de presenciar o Segundo Impacto. Alega que namorou Kaji porque ele tinha uma personalidade parecida com a de seu progenitor: “largado”, irreverente, demonstra pouco seus sentimentos.
- Gendo Ikari: embora à primeira vista seja o vilão de NGE, na verdade é um humano tão complexado e inseguro quanto os demais personagens. Racional e obsessivo, possui justificações e auto-indulgências para a execução de seu plano. A maior delas – quer rever a alma da esposa.
- Ritsuko Akagi: praticamente repete a trajetória da mãe; eterno retorno. Ryoko tem um caso com Gendo, tem inveja de Yui, mata Rei I e comete suicídio, logo após a construção do sistema Magi. Ritsuko também se apaixona pelo pai de Shinji, quase enforca Rei II, destrói as cópias restantes do Sistema Dummy e é assassinada pelo próprio Gendo.

3. Interpretação
- Elementos de psicanálise: Gestalt (ex.: “Introjection”, episódio 19, mecanismo neurótico de processamento de experiências), ansiedade da separação (o protagonista perdeu a mãe e foi abandonado pelo pai; têm dificuldades no convívio social), complexo de Édipo (Shinji; retorno à mãe como fuga da realidade – ou, da consciência da mesma), fase oral (quando ele é incorporado ao Eva 01, que contém a alma de sua mãe – voltar ou não ao mundo real?).
- O Projeto de Instrumentalidade Humana lembra aspectos da teoria de Hegel (holismo). Mundo comunitário: fundir todas as almas humanas em uma só, para compensar os vazios de cada um e criar um ser perfeito e completo. Todos os campos AT, individuais, desapareceriam para se fundir em um só. Seria o fim dos conflitos humanos, alcançando-se assim. O começo é o fim (anel), caráter de processo, auto-realização dos conceitos. É a evolução em etapas para a consecução de uma Idéia.
- Símbolos religiosos são recorrentes na série, principalmente os que remetem ao Cristianismo: Anjos e a cruz cristã (juízo sobre a morte), Velho Testamento (Deus vingativo), Magi e os três magos: “mulher, mãe e cientista” (Melquior, Gaspar, Baltasar), Lança de Longinus (crucificação).
- Além disso, há referências a Adão (pai da humanidade, feito à imagem e semelhança de Deus, Lua Branca), Lilith (a primeira esposa de Adão, recusou-se à submissão, Lua Negra) e Eva (mãe da humanidade, responsável pelo pecado original).
- O que é a Nerv? “God's in his Heaven, all's right with the world”. Folha de figueira: o que significa?
- Elementos de Kierkegaard: desespero humano. “O ‘eu’ é uma relação que se estabelece apenas consigo mesmo; voltar-se para si, em uma síntese. Há, no entanto, uma discordância interna: o desespero, que é “doença mortal”, um suplício contraditório, morrer sem literalmente morrer. É querer libertar-se de si mesmo e jamais consegui-lo.” (9º colóquio) Tal perspectiva está presente em vários dos personagens, especialmente Shinji e Misato. Sartre aparece na noção do “Outro”.
- EVA como ser humano gigante (alma construída a partir do contato com outros humanos), Unidade 01 como Deus (ou demônio?). Ironicamente, a humanidade é o último Anjo (18º no anime, 13º no mangá).
- Cabala (trazer clareza e compreensão sobre a natureza divina e a alma humana): Adão como microcosmo das forças da criação (homem arquetípico, síntese da Árvore da Vida), o divino feminino.
- Campo AT e a Alma Humana: é a proteção de que cada indivíduo dispõe para a sua alma.
- SEELE: teoria da conspiração? A raça humana está estagnada, parada; porém, ela poderia evoluir mais um passo. Moldar o verdadeiro destino da humanidade.
- O Apocalipse Angelical: Kaworu, dotado de uma beleza juvenil, instala uma dúvida cruel em Shinji Ikari, justamente no momento em que executava seu juízo final: matá-lo ou não. Neste caso, Kaworu iria se ligar a Adão, que na verdade era Lilith, ocasionando o 3º Impacto - agradando, assim, à SEELE, que provavelmente o mataria logo depois. A outra opção era ser assassinado pelo EVA 01, o que correspondia à sua vontade. Sexualmente ambíguo, chega a se declarar para Shinji, o que só reforça sua característica satânica (“o opositor”, aquele que traz a tentação).

4. Considerações Finais
- A “lição” (se é que existe uma): aceitação otimista da condição humana (é possível mudar e melhorar, apesar do meio desfavorável; “sua verdade pode ser alterada, simplesmente, pela maneira como você a aceita”) ou crítica ao gnosticismo (o homem não pode fundar uma nova realidade, imanentizar a humanidade, como se o conhecimento divino fosse acessível a alguns mortais)?
- "Qualquer lugar pode ser o paraíso, contanto que você tenha o desejo de viver" – epígrafe de The End of Evangelion. Shinji aceita a vida e recusa a instrumentalidade. Ode ao livre-arbítrio. Seria esta a boa nova sobre a criação (“Neon Genesis Evangelion”)?

Fontes:
http://en.wikipedia.org/wiki/Neon_Genesis_Evangelion_(anime)
http://www.rodrigoghedin.com.br/blog/2005/12/16/anjos-evas-e-adao-divagacoes-sobre-neon-genesis-evangelion/
http://shinjiemisato.sites.uol.com.br/review_critica_-_evangelion.htm
http://web.archive.org/web/20021224003127/http://www.animedorks.com/issues/10/evae.html

16 julho 2010

Mann e EVA

Após 10 meses desde o 1º insight, ontem consolidei a definição do tema da minha pesquisa (e futuro artigo) do PET e também da minha monografia (e pode ser um passo importante para minha tese de mestrado): Liberdade Privada e Pública em 'A Montanha Mágica'.
Eis um índice provisório:

1. A Chegada: propósitos e objetivos
2. Bildungsroman: o romance como formação cultural e humanística
3. Settembrini, o enciclopédico
4. A Pedagogia da Liberdade
5. Naphta, o revolucionário conservador
6. O Terror: as ameaças do totalitarismo
7. Autotelia: os libertários consequencialistas e principialistas
8. Res Publica: a liberdade enquanto virtude cívica
9. Finis Operis: a tensão entre liberdade privada e pública

Meu orientador sugeriu-me que, antes de tudo, eu fichasse o romance de Thomas Mann, escolhendo as passagens e diálogos mais interessantes e relevantes para o recorte que quero fazer (discussões sobre liberalismo e humanismo, as teses libertárias, a alternativa totalitária, as possibilidades de "bildung" etc.).
Não poderia estar mais empolgado para desenvolver essa pesquisa!

O projeto Estudos Humanistas promoverá um colóquio sobre Filosofia e Religião em Evangelion (mais detalhes no blog). Sendo assim, tirei minha 6ª feira para ler os mangás. Já li 10 dos 20; até o "final do fim de semana", eu termino de lê-los e de rever alguns episódios e os 2 primeiro filmes.
Porém, amanhã promete ser um dia movimentado, pois preciso corrigir os fichamentos de TPC (Foucault...), ler Nozick para o grupo de estudos, quero almoçar no McDonald's (eu mereço, rs!), e à noite encontrarei alguns amigos(as) para, mais tarde, irmos ao Galleria. Sounds like fun!
Sobre o mangá de Neon Genesis Evangelion: estou gostando bastante. Aprovei a maioria das mudanças em relação ao anime (que não são muitas, mas dão um toque especial à trama), e mal posso esperar para acompanhar os desenvolvimentos do enredo. Alguns personagens, como Gendo Ikari (vide conversa no túmulo, no final do mangá 9 da edição da Conrad) ficam ainda mais interessantes. Além disso, o tom é um pouco menos enigmático que no anime, com mais detalhes (p.ex., por meio dos pensamentos dos personagens) em passagens cruciais.
Porém, uma coisa permanece: o tom melancólico e distópico de NGE. O que é ótimo, afinal esta é a marca registrada da série.

Em off: minhas últimas aquisições em matéria de livros (sem contar, por exemplo, as toneladas de e-Books que baixei recentemente): "O Trivium"- Miriam Joseph (29/6); "Great Books of the Western World" - 54 volumes, coleção organizada por Mortimer Adler e Robert Hutchins (2/7); "A Sabedoria das Leis Eternas "- Mário Ferreira dos Santos (9/7); "Teoria Positiva do Capital" - Böhm-Bawerk (9/7); "Imposturas Intelectuais" - Alan Sokal (16/7).
Também peguei emprestado "A Decadência da Cultura Ocidental" (o título original é melhor -> "The Closing of the American Mind"), de Allan Bloom. Leituras atuais (uma por obrigação e prazer, outra por comprometimento e prazer): "O Choque de Civilizações", Samuel Huntington, e "Anarquia, Estado e Utopia", Robert Nozick.
Eis o meu lado quixotesco. Só espero que, um dia, eu esteja 'do outro lado da banca', escrevendo algo interessante ao invés de apenas acumular erudição, rs.

11 julho 2010

Uma Copa hispânica

Uruguai, 4º colocado. Argentina, 5ª. Paraguai, 8º. Chile, 10º. A colombiana Shakira cantou a música-tema do Mundial. O uruguaio Forlán foi eleito o melhor jogador. Villa, um dos artilheiros. E a campeã? Espanha. Não há dúvidas de que esta foi la Copa más hispanos de todos los tiempos.
Pois é, torci para a Itália no "1º turno" e para a Holanda no segundo. Duplo fail. Porém, foi merecido: os italianos jogaram um futebol indigno da tradição da Azzurra, e os holandeses não foram bem na final, com um estilo de jogo truculento. O 1x0 na prorrogação deu o título àquela que, embora tenha feito só 8 gols, foi uma das seleções mais ofensivas da Copa, sempre buscando o gol. Parabéns à Fúria, que finalmente põe fim à fama de "morta na praia". Agora, é campeã européia (2008) e mundial (10).

Vamos ler Dom Quixote... quer dizer, dançar a Macarena, aaaai! =D

10 julho 2010

Ética e Estética em "O Retrato de Dorian Gray"


1. Biografia

- Oscar Fingal O'Flahertie Wills Wilde nasceu em 16 de Outubro de 1854, em Dublin. Filho de intelectuais irlandeses, desde a infância teve uma educação refinada. Estudou nas universidades de Trinity e Oxford, sendo que na última conheceu Walter Pater, cujos estudos sobre a Renascença, que enfatizavam o sensualismo, exerceram profunda influência sobre Wilde.

- Participou do movimento esteticista, que defendia visões subversivas sobre arte e sociedade. Aos 30 anos, casou-se com Constance Lloyd. Trabalhou como crítico de arte na década de 1880.

- Ganhou fama inicialmente por sua oratória sarcástica e envolvente e por seus gostos e vestes extravagantes. Porém, suas peças de teatro e contos começaram a ser reconhecidos. Seu único romance, “O Retrato de Dorian Gray”, foi um sucesso comercial. Wilde foi um artista que (deliberadamente) chocou a sociedade vitoriana, e também obteve popularidade em Paris.

- A partir de 1891, desenvolveu um relacionamento com Alfred Douglas, 16 anos mais jovem que ele. Foi um caso turbulento, com muitas separações e reconciliações. Incentivado por “Bosie”, o autor envolveu-se com gays prostitutos do underground londrino.

- Acusado de sodomia pelo marquês de Queensbery, pai de Douglas, foi levado a julgamento. A vida íntima de Oscar Wilde foi devassada, com provas (cartas, principalmente) expostas ao longo do tribunal. Foi preso em 1895, condenado a dois anos de trabalhos forçados. Depois que foi libertado, o escritor exilou-se em Paris. Faleceu em 30 de Novembro de 1900, vítima de meningite cerebral.

2. Interpretação

- O prefácio de “O Retrato de Dorian Gray” é tido como um manifesto artístico, em defesa daquilo que, à época, chamava-se esteticismo ou dandismo. O artista é criador de beleza. (...) Não existem livros morais nem livros imorais. Um livro ou é bem ou mal escrito. (...) Toda arte é essencialmente inútil.” (pp.7-9). Com isso, o autor dirige-se ao leitor proponda uma ética diferenciada em sua obra, a qual coloca a beleza como prioridade. Seu livro, portanto, não deveria ser avaliado quanto à edificação (ensinar o Bem, pautar-se por valores tidos como elevados), mas quanto à forma (levar a uma experiência artisticamente agradável e prazerosa). Além do mais, aquilo que é inutilidade na perspectiva burguesa não o é para o esteta.

- Dorian Gray: um jovem de extraordinária beleza, que, assim como o Narciso mítico, não era autoconsciente dela. Porém, quando seu amigo pintor Basil produz um quadro para o qual ele foi modelo, Dorian começa a entender todos os elogios e bajulações que costumavam lhe fazer. Além disso, foi profundamente inspirado pelas idéias de Lorde Henry, como no seu ode à juventude. Dali em diante, torna-se um autêntico narcisista. Ao longo da obra, torna-se progressivamente orgulhoso e preocupado apenas com seus próprios prazeres e caprichos. Seu relacionamento curto e traumático com Sibyl Vane é um exemplo disso. “Sim - gritou ele -, matou o meu amor. Costumava excitar a minha imaginação. Agora nem sequer excita a minha curiosidade. Não exerce qualquer efeito em mim. Eu amava-a porque era maravilhosa, porque possuía gênio e inteligência, porque realizava os sonhos dos grandes poetas e dava forma e substância às sombras da arte. Agora deitou tudo a perder. É fútil e estúpida. Meu Deus! Que louco fui em amá-la!” (p. 138)

- Lorde Henry: o cinismo em pessoa. Leva uma vida de nobre ocioso e que só preocupa com o “supérfluo”, e é auto-indulgente quanto a isso. Está sempre criticando acidamente os hábitos e costumes de sua época, marcada pela hipocrisia (por exemplo, na separação radical entre vida pública e privada e na filantropia); Henry Wotton preza pela sinceridade. Talvez seja o personagem de perfil mais próximo ao do próprio Wilde. O seguinte diálogo demonstra sua predileção por se expressar em aforismos:

- Não gosta então do seu país? - perguntou-lhe.

- É nele que vivo.

- Para melhor o censurar.

- Quer que eu assuma o veredicto da Europa sobre ele? - inquiriu.

- Que dizem eles de nós?

- Que Tartufo emigrou para Inglaterra e abriu uma loja.

- A frase é de sua autoria, Harry?

- Ofereço-lha.

- Não poderia usá-la. É demasiado verdadeira.

- Não tenha receio. Os nossos compatriotas nunca reconhecem uma descrição.

- São práticos.

- São mais astutos do que práticos. Quando fazem o balanço no livro razão, saldam a estupidez com a fortuna e o vício com a hipocrisia.

- Mesmo assim, temos feito grandes coisas.

- As grandes coisas é que foram lançadas sobre nós, Gladys.

- Temos carregado com esse fardo.

- Somente até à Bolsa de Valores.

Ela fez um aceno negativo com a cabeça.

- Acredito na raça - exclamou.

- Representa a sobrevivência do esforço.

- Tem evoluído.

- A decadência seduz-me mais.

- E a Arte? - perguntou ela.

- É uma doença.

- O Amor?

- Uma ilusão.

- A Religião?

- O moderno substituto da Crença.

- Você é um céptico.

- Nunca! O cepticismo é o começo da Fé.

- Você o que é?

- Definir é limitar.” (p. 297-298)

- Basil Hallward: apaixonado por Dorian, ele encontrou no rapaz uma fonte de inspiração artística. Chega mesmo a afirmar que revelou muito de si mesmo no retrato que fez de D. Gray. Dos três amigos, é o mais moralista, porque acredita que o Bem e o Belo não podem ser separados. Preocupado com os arroubos imorais de Harry (apelido de Henry Wotton), lamenta-se quando Dorian se torna uma pessoa cada vez mais insensível e arrogante. “Adorei-o demasiado. Fui castigado. E você adorou demasiado a si mesmo. Fomos ambos castigados” (p. 241)

- O retrato: Dorian indigna-se quando vê a obra pronta, pois é tão bela que ele logo nota que ela continuará sempre encantadora, enquanto ele irá envelhecer. Sendo assim, em uma espécie de “reza”, ele pede para que o quadro sofra as marcas do tempo, enquanto que ele continuaria sempre jovem e esbelto. Porém, ao longo da obra, D. Gray percebe que, toda vez que comete algo pecaminoso, o quadro reflete isso: por exemplo, um sorriso cruel, rugas, desbotamento dos cabelos etc. Muitos comparam esta trama com a venda da alma ao diabo presente na lenda do Fausto ou mesmo com romances góticos como “O Médico e o Monstro” (Stevenson). “O retrato, quer mudasse ou não, tornar-se-ia o símbolo de sua consciência” (p. 144)

- Os diálogos: sempre marcados pelo deboche e sarcasmo dos personagens. Ocupam a maior parte do livro, e revelam mais sobre a história do que as descrições do narrador.

O político olhou para ele intensamente.

- Que transformações propõe então? - perguntou.

Lord Henry riu-se.

- Não desejo mudar nada em Inglaterra, excepto o tempo - respondeu ele. - Satisfaz-me bastante a reflexão filosófica. Mas, como o século XIX abriu falência devido a um excesso de dispêndio com a simpatia, eu sugeria que recorrêssemos à Ciência para nos organizar. A vantagem das emoções é a de nos extraviar, e a vantagem da Ciência é a de não ter emoções.

- Mas nós temos responsabilidades tão graves - arriscou Mrs.

Vandeleur, timidamente.

- Terrivelmente graves - repetiu, como um eco, Lady Agatha.

Lorde Henry dirigiu um olhar para Mr. Erskine.

- A Humanidade leva-se a si própria demasiado a sério. Esse é o pecado original do mundo. Se o homem da caverna tivesse aprendido a rir, a História teria sido diferente.

- O senhor, realmente, deu-me ânimo - interveio a duquesa, com gorjeios na voz. - Tive sempre uma certa sensação de culpa quando vinha ver a sua querida tia, pois não me interessa absolutamente nada o East End. Futuramente, poderei olhá-la de frente sem corar.

- Um certo rubor fica muito bem, duquesa - observou Lorde Henry.

- Só quando somos jovens - retorquiu ela. - Quando uma senhora de idade como eu fica corada é mau sinal. Ai, Lorde Henry, se me pudesse dizer como ficar jovem outra vez.

Ele ficou a pensar por uns instantes.

- Consegue lembrar-se de algum erro grave que tenha cometido nos seus tempos de juventude, duquesa? - perguntou-lhe ele, olhando-a do outro lado da mesa.

- Muitos, receio bem - exclamou ela.

- Então cometa-os outra vez - disse ele, gravemente. – Para se voltar à juventude, basta que se repitam as mesmas loucuras.

- Que teoria deliciosa! - exclamou ela. - Tenho de pô-la em prática.

- Que perigosa teoria! - foram as palavras saídas dos lábios estreitamente apertados de Sir Thomas.” (p. 66 e 69)

- Aristocratismo anárquico: o aproxima-se de Nietzsche ao ter posições simultaneamente aristocráticas (desprezo por doutrinas sociais e a própria questão da pobreza, tida como esteticamente desagradável) e rebeldes em relação ao “status quo” burguês. As opiniões políticas do autor revelam isso nitidamente. Em “A Alma do Homem sob o Socialismo”, ele apresenta uma visão anarquista da ideologia socialista, enfatizando elementos individualistas, incomuns nas versões marxista e fabiana, e elitistas. Enfim, algo como um “socialismo aristocrático”. Para que haja um livre e pleno desenvolvimento das capacidades humanas, certas instituições burguesas (como o casamento e a propriedade) deveriam ser abolidas.

- Os crimes: o protagonista sente pouca ou nenhuma culpa quando, por exemplo, descobre do suicídio de Sibyl ou quando assassina Basil. Esta corrupção é carregada de auto-indulgência e fascinação pelo moralmente reprovável. “Havia momentos em que o mal aparecia como um dos meios de realizar a sua concepção do belo” (p. 223).

- Ética e Estética: embora seja claro que Wilde pregue o relativismo moral, por estar em desacordo com os costumes vigentes em seu contexto social e histórico, não se pode dizer que ele também relativize a ética. Porém, o autor parece buscar uma nova concepção.

Enquanto a filosofia alemã (Schiller, por exemplo) via na estética uma doutrina teórica (dar sensibilidade à razão e vice-versa, permitindo a abertura a todas as possibilidades, o que seria fundamental para a própria faculdade de juízo), os franceses e ingleses promoveram um movimento artístico chamado esteticismo. Este valorizava a beleza como supremo ideal e pregava duplicidade (viver uma vida dupla, sem se sentir pressionado a minar personalidades latentes), influência (aprender com algo ou alguém a perder a inocência e a inexperiência) e, em última instância, a recusa da idéia de responsabilidade, pois um indivíduo, se cometeu algo tipo como reprovável, não deve se sentir culpado por seus atos.

Ou seja, ao contrário dos gregos (que viam a ética e a estética como indissociáveis) e dos cristãos (que, pela própria valorização da alma em detrimento da matéria, colocavam o Bem como mais importante que o Belo), os esteticistas defendem que a beleza pode contrariar o que é considerado valoroso, justo e correto. Porém, os contos wildeanos, de teor moralizante, voltam ao ideal grego de junção de ambas. Portanto, por mais que as idéias e as condutas do autor sejam moralmente controversas à sua época, isso não quer dizer que ele esteja abolindo noções éticas, mas sim defendendo que o Belo ganha papel primordial nelas – mesmo que a custo de prejudicar outras regras de conduta igualmente (ou até mais) importantes.

- Hedonismo: concebe o prazer como o único valor intrínseco, o que justifica a busca que tudo aquilo que dê o mínimo de dor e o máximo de gozo. Defendido por Henry, praticado por Dorian. Propõe viver a vida ao extremo, pois a juventude é finita, e o melhor a se fazer é aproveitar todas as possibilidades e prazeres oferecidos pela vida. Com isso, não há restrições para a busca de tudo aquilo que é tido como pecado. O protagonista, seguindo tal filosofia de vida, dedica-se ao luxo e à luxúria.

Sim, deveria haver, como profetizara Lord Henry, um novo hedonismo que recriasse a vida e a salvasse desse austero e sombrio puritanismo que, curiosamente, está de novo em voga nos nossos dias. (...) Deveria (...) ensinar o homem a concentrar-se nos momentos da vida, visto ela ser um breve momento.” (p. 200)

- Hipocrisia ou arrependimento? No último capítulo, aliviado pela morte de James Vane, que pretendia vingar a irmã Sibyl, ele parece resoluto a praticar boas ações. Porém, permanece-lhe a dúvida se realmente ele mudou ou se tal atitude não passa de vaidade. Seu “suicídio” (ele enfia uma faca no quadro-retrato) inverte os papéis: seu cadáver é de um homem velho e de aparência desagradável, e toda a beleza e juventude que possuía enquanto vivo “transferem-se” para o quadro. Com isso, o belo Dorian eterniza-se na obra de arte. Portanto, embora nos momentos finais fique subentendida certa mensagem moral (“Todo excesso, assim como toda renúncia, traz a sua punição”), o desfecho mantém, com as devidas proporções, a relação Beleza > Bem.

3. Revisão bibliográfica

- Há algo paradoxal a respeito da ética da beleza. Conflitos acirrados entre Oscar Wilde e os críticos o levaram a propor uma ética da beleza : não existe essa coisa de um livro moral ou imoral. Livros são bem ou mal escritos. Importa que um livro seja belamente escrito. Mas como Oscar Wilde ficou exacerbado por comentários de críticos que chama de corruptos e ignorantes, é difícil poder se chegar a algum diálogo e muito mais ainda a um consenso sobre a ética da beleza como critério de leitura de um texto literário. Ficará mais facil aos críticos entender que a beleza exacerbada como temática do texto "O retrato de Dorian Gray" tenha servido posteriormente à própria condenação de Oscar Wilde, da qual os críticos podem aparecer como cúmplices. A ética da beleza mesclada à agressão de Oscar Wilde contra os críticos não pde ser alheia à agressão da condenação. (...)Algo paradoxal: Oscar Wilde propõe uma ética da beleza. E o livro mostra como a absolutização da beleza acaba sendo a-ética.”

(“A Beleza em O Retrato de Dorian Gray”, Jacques Laberge)

- Wilde com seu The Picture of Dorian Gray (O Retrato de Dorian Gray) foi o responsável pela criação do principal exemplar romanesco inglês do decadentismo esteticista. (...) O fato do jovem terminar por esconder o quadro é uma metáfora sobre a atitude tomada pela sociedade burguesa com relação à arte. Ao invés de aprender com ela, de reconhecê-la como modelo denunciatório das corrupções do humano na realidade, a sociedade burguesa prefere desviar os olhos. A figura do esteta enquanto degustador dos pecados é criticada através do protagonista. Os ensinamentos de Pater são (re)apresentados pelo personagem de Henry Wotton apenas para serem desacreditados. O próprio Pater, em resenha sobre o livro, observa que lorde Wotton não consegue reconhecer que a vida da mera sensação é anárquica e autodestrutiva. Dorian Gray é seu discípulo e termina mal, é o primeiro mártir do esteticismo à la Pater e a negação wildeana da divisão entre ética e estética.”

(“Um Esteta na Pátria do Utilitarismo”, Ricardo Miskolci)

4. Wilde e o Glam Rock

- “O Retrato de Dorian Gray” tornou-se o livro de cabeceira da juventude decadente da Inglaterra vitoriana, nos últimos anos do século XIX. Mesmo que, na época, tenha sido discutido mais pela imoralidade que pela qualidade literária – foi inclusive usado como uma das provas contrárias a Wilde em seu julgamento -, com o passar dos anos passou a ser considerado como um clássico moderno.

- A influência dos escritos wildeanos (e o estilo de vida que pregavam) alcançou o rock ‘n’ roll, principalmente a partir dos anos 70. O advento do glam rock representou uma fase deste estilo musical em que se mesclavam roupas espalhafatosas, shows teatrais, ênfase nas guitarras, maquiagem, androginia e todo tipo de excesso. É como se o “decadentismo” tivesse voltado, quase um século depois.

- David Bowie é o maior expoente dessa tendência. Seu disco “The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars” (1972) foi um marco; era um album conceitual sobre um extraterrestre que é um “rock star”, que ao mesmo tempo prega paz e amor e é sexualmente promíscuo e “junkie” (usuário de drogas). Pode-se dizer que Bowie (o qual havia se declarado bissexual, meses antes) estava falando de libertação sexual de uma forma genuinamente artística – algo que Wilde certamente aprovaria. O cantor Boy George, por exemplo, disse: “Num tempo em que tabus sociais e sexuais estavam sendo quebrados, Bowie, como o personagem Ziggy Stardust, criou um mundo onde as possibilidades eram infinitas: você podia ser quem quisesse”.

- Na década seguinte, um dos destaques foi o conjunto The Smiths, cujo vocalista, Stephen Morrissey, era um fã confesso de Oscar Wilde. A canção “Cemetery Gates” é uma homenagem ao escritor nascido em Dublin (assim como o próprio Morrissey). Temáticas homoeróticas aparecem em canções como “Hand in Glove” e “The Boy with the Thorn Is His Side”.

- Nos anos 90, a estética andrógina voltou ao rock britânico, por meio de bandas como Suede e Placebo. Em canções sexualmente ambíguas, nas quais celebravam um estilo de vida hedonista (“The Drowners” e “Nancy Boy”, respectivamente, p. ex.), foram importantes na cena musical do Britpop.