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Kaio

 

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23 maio 2017

Uma despedida em grande estilo... ou o início do declínio criativo?


Em 23 de Maio de 1997 os Titãs lançaram o CD Acústico MTV. O projeto de um disco ao vivo com versões desplugadas e orquestradas de seus maiores sucessos marcava uma nova fase na carreira da banda, caracterizada pelo flerte com a MPB e pela busca de um público mais amplo. Até pouquíssimo tempo antes, os Titãs estavam associados ao rock pesado de Tudo Ao Mesmo Tempo Agora (91), Titanomaquia (93) e, em parte, Domingo (95) - aliás, neste álbum a banda já começava a buscar, pela primeira vez em 10 anos, uma sonoridade mais pop; vide a melódica faixa-título.
Com Acústico MTV o septeto e Liminha (produtor dos melhores discos titânicos nos anos 80) refizeram completamente os arranjos de alguns de seus clássicos, de tal forma que as letras ganharam maior destaque (afinal agora não estavam soterradas por guitarras e/ou samples) e que até o estilo musical de certas canções mudasse (as eletrônicas "Comida" e "Diversão" ganharam um tom festivo, o reggae "Pra Dizer Adeus" virou um pop romântico, o punk "Palavras" teve uma releitura mais lenta etc.).
A banda, a gravadora WEA e a MTV já previam o sucesso do Acústico (apostava-se em 500, 600 mil unidades), mas as vendas foram muito maiores: 1,5 milhão de cópias só em 1997 e mais 250 mil em 98. Foi o disco mais vendido da carreira dos Titãs, fazendo com que desde crianças até adultos que não gostavam do som mais roqueiro da banda começassem a ouvi-los.
Para além da repercussão comercial do Acústico dos Titãs, é preciso reconhecer que este é um álbum essencial na discografia da banda. A seleção de faixas foi cuidadosa, e privilegiou Õ Blésq Blom (álbum de 89 que, por trás dos experimentos com eletrônica, possui algumas das melhores letras dos Titãs), que contribuiu com 4: "O Pulso" (com a participação do ex-titã Arnaldo Antunes), "Flores" (belo dueto de Branco Mello e Marisa Monte), "Palavras" e "32 Dentes". Além disso, 3 sobras de estúdio deste trabalho foram resgatadas para o Acústico MTV: "Nem Cinco Minutos Guardados", "A Melhor Forma" e "Não Vou Lutar". 
O lendário Cabeça Dinossauro (86) tem 6 faixas no CD, mas 4 delas são vinhetas. Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas (87) tem apenas duas, mas são justamente a abertura ("Comida") e o encerramento ("Diversão") do álbum, ambas com vocais espetaculares de Paulo Miklos. Da atmosfera grunge de Titanomaquia uma música foi trazida para o novo formato: "Hereditário", de Nando Reis, justamente o titã mais afinado com a MPB. Os dois primeiros discos também foram lembrados no repertório, e foi de Televisão (85) que saiu o maior sucesso do Acústico, "Pra Dizer Adeus", também cantada por Paulo. Outro grande hit foi "Os Cegos dos Castelo", canção inédita de Nando.
O legado deste disco é vasto, indo desde o início da febre dos Acústicos MTV "ressuscitando" bandas oitentistas (Os Paralamas do Sucesso, Capital Inicial, Kid Abelha, Ira! etc.; o show da Legião Urbana neste formato, gravado em 92, foi enfim lançado, sete anos depois) até uma nova direção estética para a banda: depois do sucesso estrondoso do CD e da turnê, os Titãs resolveram manter por mais dois anos a fase acústica, com mais regravações de sucessos do passado (Volume Dois, 98) e até de canções de outros artistas (As Dez Mais, 99). A fórmula se desgastou, mas os Titãs continuaram adotando uma linguagem mais pop do que rock até 2012, quando a turnê dos 30 anos de Cabeça Dinossauro fez a banda resgatar um som mais cru e direto, o que levou ao disco Nheengatu (2014); mas, essa já é outra história... Por enquanto, celebremos o vigésimo aniversário de um dos discos ao vivo mais importantes e influentes da música brasileira.

P.S.: O Acústico não entra no meu top 5 dos Titãs (só para constar: 1. Õ Blésq Blom, 2. Cabeça, 3. Jesus, 4. Tudo Ao Mesmo Tempo Agora, 5. Titanomaquia; menção honrosa para Domingo), mas ainda assim gosto muito dele. Ele pode ter sido o início do declínio criativo dos Titãs, mas prefiro encará-lo como uma despedida em grande estilo da melhor fase da banda.

17 maio 2017

17/5/17

Quando eu tinha sete anos de idade, desenvolvi minha obsessão pelo número 17. Sonhava em ter 17 anos de idade (o que foi uma profecia auto-realizada, pois foi uma das melhores épocas da minha vida - li muitos livros, passei no vestibular da UnB, comecei a morar sozinho em Brasília etc.); exultava com o fato de que minha data de nascimento dava 17 (29/6 -> 2 + 9 + 6 = 17); e 17 de Maio se tornou meu dia favorito do ano (pois eu também gostava do número 5).
Sendo assim, o dia de hoje, 17/5/17, na ótica do jovem Kaio, é profundamente cabalístico. 

De fato busquei fazer com que hoje fosse melhor do que os últimos dias. Estou em Goiânia há duas semanas, tratando de uma infecção pulmonar, e minha rotina na maior parte dos últimos dias se resumiu a TV, computador, refeições e dormir. A situação mudou um pouco quando minha namorada veio me visitar, entre os dias 11 e 15; joguei muito Age of Empires III com ela. 
A partir de hoje resolvi voltar a ler (embora tenha começado com o pé esquerdo: um texto sobre um tema interessante - "Merquior, Lévi-Strauss e a modernidade" - mas extremamente mal escrito; a autora Maria Heloísa Fénelon-Costa parecia querer imitar o estilo prolixo dos filósofos franceses e artistas de vanguarda que defende das críticas de Merquior) e a jogar Pokémon SoulSilver (resolvi logo o problema da Power Plant para poder acordar o Snorlax e liberar o caminho para Pewter, e assim ganhar as insígnias na ordem que eu quiser).

Essa doença no pulmão (cujos sintomas incluíam tosse, fadiga e febre) parece ser uma forma extrema do meu corpo de me avisar do meu sedentarismo e da minha mania de romântico do século XIX de ficar em ambientes fechados, pouco arejados. Vou precisar mudar bastante meus hábitos, inclusive alimentares. Talvez seja o passo que faltava para eu amadurecer; pena que tenha precisado chegar a esse ponto, mas espero que eu tenha aprendido a lição.

O artefato de cultura pop que mais aparece ao longo do meu dia é Os Cavaleiros do Zodíaco - desde o mangá que leio enquanto tomo os quatro comprimidos de manhã até o anime que assisto de segunda a sexta, às 20h, na Rede Brasil (aqui em Goiânia posso assisti-lo na TV, pois tem no pacote da GVT; lá no Rio eu via os episódios pelo streaming do site da emissora); às vezes também vejo a reprise, às 10h. A propósito, ontem acabaram as reprises e hoje será exibido o penúltimo episódio da Batalha das Doze Casas, uma das melhores novelas, digo, sagas de anime de todos os tempos.

P.S.: Escrevi esse post ao som de faixas que constavam na coletânea Rock Brasil, lançada pela Som Livre em 1996 e que ganhei do meu primo em 97. A compilação me apresentou clássicos como "Marvin" e "Homem Primata" (Titãs), "Inútil" e "Nós vamos invadir sua praia" (Ultraje a Rigor), "Fixação" (Kid Abelha) e "Envelheço na Cidade" (Ira!). Eu e minhas ondas nostálgicas... Semana que vem tem mais, afinal é o 20º aniversário do Acústico MTV dos Titãs.

05 maio 2017

Obrigado por tudo, Portella


Conheci o professor Eduardo Portella no dia 17 de Setembro de 2015, em um evento da Academia Brasileira de Letras no qual foi exibido um documentário sobre José Guilherme Merquior. Fui apresentado a ele pelo professor João Cezar de Castro Rocha, que assim que me ouviu tratando Portella por “você” pôs-se a corrigir minha “falta de etiqueta” e me disse para tratá-lo por “senhor”.
Na semana seguinte, quando comecei a assistir às aulas do professor Portella no Colégio do Brasil, em Laranjeiras, não havia mais motivo para formalidades; Eduardo era muito modesto e gentil para exigir um tratamento senhorial. Desde a primeira aula ficou claro que dividíamos vários interesses intelectuais; o maior deles, claro, era a obra de Merquior. Nos dois cursos dele que fiz (um no 2º semestre de 2015 e outro no 1º semestre de 2016), o professor e nós alunos debatemos vários temas de filosofia, literatura, estética, política, religião e até cultura pop. 
Portella me fazia relatos sobre sua amizade com Merquior; soube de várias histórias curiosas e divertidas, mas também de seus últimos meses de vida, batalhando contra um câncer de estômago.
Ao perceber meu interesse por várias obras publicadas por sua editora, Tempo Brasileiro, o professor doou-me vários livros e revistas. Os primeiros deles foram, claro, de José Guilherme: “O Homem e o Discurso” (uma entrevista com Foucault conduzida por ele e Sérgio Paulo Rouanet), “O Estruturalismo dos Pobres” e uma edição especial da Revista Tempo Brasileiro com ensaios em homenagem a Merquior. Ao longo do tempo, as doações foram se diversificando, e achei artigos da revista sobre Thomas Mann, Escola de Frankfurt, estruturalismo, ensaísmo (aliás, Portella escreveu o ótimo “O ensaio como ensaio”), crítica/crise da modernidade, liberalismo (foi da edição 64/65 que saiu o famoso “O argumento liberal”, de José Guilherme) etc. Enfim, talvez seja uma das melhores revistas de cultura geral que o Brasil já teve; é uma pena que já não seja tão famosa quanto o foi nos anos 60 e 70.
Eu iria ter um 3º curso com Portella no segundo semestre do ano passado. Além disso, eu e outros alunos estávamos com planos para ajudá-lo a levantar a editora e o próprio Colégio do Brasil; pensamos até em um ciclo de palestras. Infelizmente tudo foi interrompido quando, na manhã do primeiro dia de aula, o funcionário Paulo Cesar me ligou, dizendo que o curso foi cancelado de última hora por causa de uma regra da pós-graduação em Letras da UFRJ de que um mesmo professor não pode dar dois cursos de pós no mesmo ano. Creio, porém, que os verdadeiros motivos dos professores do departamento eram mesquinhos. Eu e meus colegas ficamos sem curso, e o professor Portella ficou muito triste com a situação.
Neste semestre o curso planejado para o anterior seria lecionado, mas foi sendo adiado porque o professor estava doente. Estava assistindo por acaso o Jornal Nacional na terça, dia 2 de Maio, quando fui surpreendido pela notícia de que Eduardo Portella havia nos deixado, aos 84 anos. Não pude conter as lágrimas; não só pelo choque, mas porque ele foi muito importante na minha formação intelectual. Eu pretendia chamá-lo para a minha banca, e esperava que ele ficasse orgulhoso de finalmente ver a defesa de uma tese sobre seu amigo José Guilherme. Infelizmente isso não será mais possível. Por outro lado, ainda há uma tarefa a ser feita: preservar seu legado. Sinto-me um pouco seu herdeiro pelo ano de convivência semanal e pretendo me pautar no professor para, quem sabe, ser um intelectual minimamente digno daquilo que ele e Merquior nos deixaram.
Obrigado por tudo, Portella.