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Kaio

 

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14 agosto 2011

Son of...?

Meu pai acaba de me ligar. Aproveitei, obviamente, para desejar "Feliz Dia dos Pais", já esperando a leve bronca que viria (e veio, é claro) por eu não ter ligado antes para ele. Com uma voz que denotava decepção, não demorou muito para que ele dissesse "tchau". Aliás, situação bem parecida ocorreu 3 anos atrás, quando também meu pai me ligou no aniversário dele para "me lembrar" da data (se bem que, daquela vez, ele ligou de manhã, o que minimiza o meu esquecimento).

O que mais me preocupa é a minha indiferença perante isso. É tão grande que fiquei perturbado com ele a ponto de escrever um post sobre isso. (Algo parecido ocorreu quando, em Janeiro meu avô paterno morreu e eu não fiquei triste; sequer fui ao funeral) Não me senti mal de não ter desejado "Feliz Dia dos Pais". Talvez porque eu não veja meu pai como pai. Nisso a culpa é tanto dele quanto minha; dele, porque nunca evocou perante mim uma figura paterna, parecendo mais com um tio ou um irmão mais velho; minha, porque também nunca me esforcei para melhorar a minha relação com ele.

Meu irmão do meio e meu pai, pelo contrário, tem um ótimo relacionamento, talvez porque tenham personalidades parecidas. São pacatos, "caipiras", brincalhões e sem grandes perspectivas de vida (não que isso seja necessariamente ruim, que fique claro; apenas não sou assim). O passatempo preferido deles é ir a alguma chácara no fim de semana. Quanto a mim, mesmo antes de meu irmão nascer, nunca me identifiquei com esses "programas de índio". Quando tinha 3 anos e fui com ele e minha mãe ao Araguaia, foram dias irritantes, principalmente pelos mosquitos. Nunca me identifiquei com meu pai, e não me lembro de uma única experiência marcante na minha vida na qual ele estava presente. (Tudo bem que foi durante uma viagem com ele a Catalão que, aos 13 anos, eu comprei a minha primeira "Playboy", mas o que tinha tudo para ser um momento histórico, em que o pai orienta o filho no amadurecimento da sexualidade deste, não teve nada de mais. Foi algo corriqueiro, e nossa relação não mudou em nada.)

É lamentável constatar que as únicas características que herdei do meu pai foram algumas bandas no meu gosto musical: U2, Talking Heads, Barão Vermelho e Legião Urbana. (Até mesmo porque estas são peixes fora d'água nas músicas que ele ouve - em geral, ele escuta música sertaneja e gospel) Nossos temperamentos são quase diâmetros opostos. Se bem que não sou muito parecido com quase ninguém na minha família... As únicas pessoas que partilham traços de personalidade comigo são o meu avô materno (rabugento e gosta de ler) e minha mãe (sistemática e otimista). Talvez também meu irmão caçula terá um pouco de Kaio, já que percebo nele vários pontos em comum com a criança que eu era na mesma idade (8 anos) - fanático por futebol, fala de forma articulada e seguindo a norma culta, detesta ser contrariado, é um aluno aplicado...

Antes que fujamos ao assunto, voltemos ao meu "pai". O fato é que, desde a minha infância, eu nunca o senti realmente como pai. Quando falo que não compartilhamos experiências marcantes, parte disso reside no fato de que só me lembro de situações com ele que eram de lazer, "fim-de-semanescas". Nenhuma conversa profunda, briga homérica ou desabafo que gera cumplicidade - coisas que tive com minha mãe, a qual me foi muito mais "paternal" que ele. Quando eles se divorciaram, em 1999, senti a mesma indiferença que senti hoje. Para mim foi uma coisa natural, previsível. Não aumentou nem diminuiu meu vínculo com ele. (Em compensação, para o meu irmão do meio, essa separação do meu pai e de minha mãe teve efeitos bem diversos, pois ele passou a ter duas famílias: mesmo se sentindo bem mais próximo do meu pai, ele continuou tendo que conviver com minha mãe. Suspeito até que ele ainda se ressente de não ter os dois juntos, mesmo depois de quase 10 anos convivendo com nosso padrasto.)

Falando no meu padrasto, ele chegou bem mais perto que meu pai de ser a "figura paterna". Conversávamos bastante sobre os mais variados assuntos e, quando necessário, ele sabia demonstrar autoridade que um pai precisa ter perante o filho. Porém, assim como este, viajava bastante, o que dificultava uma relação mais contínua. Além disso, a essa altura do campeonato, eu já era adolescente, portanto já tinha uma personalidade própria o bastante para caminhar por meus próprios trilhos, sem me espelhar em alguém. Sendo assim, na minha vida meu padrasto exerceu o papel de um "tio sábio", enquanto coube a meu pai o de um "tio engraçado".

A conclusão a que chego é que, embora de fato tenha sido um erro não ter ligado para o meu pai hoje (dentre outras ausências de demonstração de afeto ao longo dos últimos anos), isso não me abala o bastante para que eu me sinta impelido a sentir remorso e, "epifanicamente", me reaproximar dele. Já é tarde demais. Continuaremos a nos encontrar e conversar, mas ele sempre será apenas o "tio engraçado", que faz piadinhas quando bebe (e, a julgar pela "barriga de chope" dele, isso é bem freqüente, rs), buzina e diz indecências para as mulheres na rua, imita com perfeição a risadinha do Mutley e, quando vem para Brasília, compra churrasquinho para mim. Aliás, nem exigo mais do que isso dele.

 

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