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Kaio

 

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05 novembro 2013

Entertain Us: um top 10 do Blur

10. Out Of Time: A melhor música de Think Tank (2003) é uma balada de melodia delicada e letra reflexiva, evocando uma sensação paradoxal de melancolia e otimismo: “I don't know what life will be / But if we stop dreaming now / Lord knows we'd never clear the clouds”. Assim como outras músicas desse Top 10, Out Of Time conta com um clipe que a complementa e eleva, ao mostrar a solidão de uma jovem mulher que trabalha nas forças armadas – e, com isso, indiretamente soa como uma canção anti-guerra, algo sintomático se considerarmos que foi lançada três semanas depois do início da Guerra do Iraque.

9. Parklife: Graças a ela eu comecei a ouvir Blur para valer. Em 2005, depois de ler um texto no Omelete sobre o álbum homônimo, resolvi baixar Parklife. Não me arrependi, pois fui fisgado assim que o refrão tocou pela primeira vez. Quando li os versos, meu vício por ela cresceu mais ainda, afinal trata-se de um deboche à vidinha medíocre da classe média britânica: “I feed the pigeons, I sometimes feed the sparrows too / It gives me a sense of enormous well being / And then I'm happy for the rest of the day / Safe in the knowledge there will always be a bit of my heart devoted to it”. Enfim, é uma canção no velho espírito mod, à la The Jam ou Who, marcada pelo senso de humor e pelo riff cativante.

8. The Universal: Esta bela música é um tratado sobre anedonia, isto é, a perda da capacidade de sentir prazer. Damon Albarn, o Simmel de nossos tempos, faz o retrato de uma geração apática, deprimida e misantrópica, por mais “sociável” que se alegue: “No one here is alone / Satellites in every home / Yes the universal is here / Here for everyone”. Tal diagnóstico é fortalecido diante de fenômenos observados nas redes sociais de nossa década. O clipe, cheio de alusões a Laranja Mecânica, é genialmente perturbador.




7.  For Tomorrow: Escrita no Natal de 1992 para ser o primeiro single de Modern Life is Rubbish, é a faixa mais representativa deste disco. Albarn revela em For Tomorrow o seu lado “cronista social”, à la Ray Davies (The Kinks), analisando as angústias cotidianas dos londrinos. Os arranjos com metais são impecáveis, e dão uma dimensão épica a esta canção. O refrão “la la la” é extremamente pegajoso (no bom sentido).

6. Tender: Se existe uma faixa do Blur que o público pode cantar por dez minutos e se prolongar até quando a banda já tiver terminado, ela é Tender. Este hino gospel tem uma mensagem poderosa: “Love’s the greatest thing that we have”. Não por acaso, ela vem acompanhando minha vida amorosa desde que a conheci. Já foi trilha sonora de recuperação após desilusões e fossas, e hoje em dia felizmente é a música que me faz pensar em minha namorada – que, aliás, considera Tender como sua favorita do Blur.

5. Girls & Boys: Em uma das várias ironias que cercam a trajetória do Blur, a música que os fez estourar nas paradas em 94 tinha um estilo bem parecido com o de uma cena musical que já havia saído de moda na Inglaterra: a “indie dance” de Stone Roses, Happy Mondays e cia. Para agravar a situação, a letra é extremamente sarcástica em relação ao público que consumiu esta música vorazmente desde então: jovens hedonistas, que celebram a androginia (“Girls who are boys (...) who do boys like they’re girls”) e a promiscuidade (“Love in the 90's is paranoid”) e que estão “avoiding all work, because there’s none available”. Extremamente dançante, Girls & Boys também tem como trunfo a antítese entre o baixo funkeado de Alex James e a guitarra furiosa de Graham Coxon.

4. Song 2: Se o critério fosse “número de vezes que ouvi”, esta ficaria em primeiro lugar. Acredito, no entanto, que as três canções a seguir são lírica e melodicamente superiores, e me proporcionam uma contemplação artística mais ampla. De toda forma, Song 2 é de fato uma das obras-primas do Blur. Apesar de semelhante à estética do Nirvana, ela é um deboche à falta de sentido das letras do grunge, e prima pela irreverência: “Woo-hoo, when I feel heavy metal / (...) And I'm pins and I'm needles / (...) Well I lie and I'm easy / All the time but I'm never sure why I need you / Pleased to meet you". Em apenas 2 minutos, a banda consegue fazer uma canção-símbolo dos anos 90, seja no que esta década teve de melhor (o renascimento do rock minimalista, sem firulas) e de pior (a postura sanguessuga do mercado fonográfico em relação ao grunge e ao “rock alternativo” em geral – basta lembrar que foi Song 2 quem explodiu o Blur nos EUA, tocando em desde filmes de ação até games como FIFA 98 – por meio do qual, aliás, a descobri, num longínquo Junho de 1998).

3. Coffee & TV: Com um ritmo delicioso conduzido pela bateria, Coffee & TV é uma das canções mais famosas da banda, graças ao inesquecível clipe que conta a saga de uma caixa de leite para ajudar uma família a encontrar um filho desaparecido: Graham Coxon, justamente o compositor desta faixa. A letra do guitarrista do Blur demonstra uma sinceridade cortante em versos como “I've seen so much, I'm going blind / (...) Sociability is hard enough for me / Take me away from this big bad world / and agree to marry me / So we can start over again”. É uma confissão de fraqueza – e disposição para se redimir; não por acaso, dizem que Coxon a escreveu em meio à sua luta contra o alcoolismo.

2. Beetlebum: Em uma canção em que as metáforas sobre sexo e heroína se mesclam de forma psicodélica, a banda – como bem observou Stephen Thomas Erlewine, do AllMusic Guide – atravessa o “Álbum Branco” dos Beatles no espaço de cinco minutos. Beetlebum começa com um riff inusitado, ganha contornos harmônicos com o vocal de Albarn, torna-se extremamente poderosa no refrão e seu coda é uma viagem narcótica regida pelo belíssimo solo de guitarra de Coxon. Nothing is wrong / I just slip away and I am gone”. É o tipo de perfeição sonora que uma banda – isto é, uma banda genuinamente boa – só alcança uma vez. Eu a consideraria a magnus opum do Blur se não houvesse outra faixa que me captou de forma mais visceral ainda...




1.  Country Sad Ballad Man: Eis uma escolha que concordo ser inusitada, afinal trata-se de uma música que sequer foi lançada como single. Além disso, ela tem uma tarefa árdua: é a terceira faixa num disco (Blur, 1997) que começa com Beetlebum e Song 2. À primeira audição, Country Sad Ballad Man pode parecer uma canção preguiçosa; mas, quanto mais se ouve ela, revela-se justamente nessa letargia o seu charme. Os vocais em falsete de Damon Albarn são impagáveis, assim como o triste riff de violão. Esta canção é como uma ressaca após os excessos dos anos em que o Blur – junto com o Oasis – dominou a cena musical britânica (1994-96): “VIP 223 / Have my chances  / They have me  / Now stay up nights   / Watch TV  / I'm country sad  / I'm a ballad man”. O tema central do álbum anterior (The Great Escape, 1995) e do seguinte (13, 1999) é sintetizado nesta faixa: estamos falando da solidão, que acompanhava Albarn mesmo com a fama e uma namorada que era vocalista de uma banda de sucesso (Elastica). Temos aqui, portanto, um rockstar melancólico, que percebe que o sucesso não o preencheu existencialmente. E, quando menos se espera, Country Sad Ballad Man muda completamente de ritmo, e se torna uma canção roqueira e desesperada, apenas para, segundos depois, encerrar-se de forma abrupta.

 

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