[Meu Facebook] [Meu Last.FM] [Meu Twitter]


 

 

Kaio

 

Veja meu perfil completo

 

 

 

 

02 outubro 2007

O fardo tropical (?)

Consegui terminar de ler "Raízes do Brasil". O ensaio de Sérgio Buarque de Holanda é tão bom que, literalmente, era uma questão de tempo para que eu o concluísse.
Gostei muito da maneira como o autor analisou a influência da tradição cultural dos ibéricos no Brasil. Segundo ele, para a formação de nosso povo, foi decisiva a mentalidade desleixada dos portugueses, que visavam ao "máximo de riquezas com o mínimo de esforço". Esta, somada ao personalismo nas relações sociais (que acarretaria em monstruosidades como o coronelismo), a facilidade em assimilar culturas alheias e o senso estritamente prático e apegado aos hábitos são visíveis na formação da nação brasileira durante os últimos cinco séculos.
Segundo Sérgio, seria difícil afirmar que o Brasil teve de fato a valorização do trabalho, por mais "braçal e árduo" que este viesse a ser. Aliás, fica visível que a influência weberiana na obra dele é menor do que dizem certos intelectuais; aliás, no penúltimo capítulo ("Novos tempos"), ele admite com certa cautela idéias como a de que países de religião protestante são mais prósperos e disciplinados. Digamos que o faz com razão, pois Max Weber abusa dos tipos ideais, podendo estes assumir o caráter de generalizações se mal empregados. Como diz o próprio texto introdutório de "Raízes do Brasil", uma influência mais notável para o historiador foi um pensador italiano do século XVIII, João Batista Vico, que elaborou análises historistas, apontando as 'espirais' presentes no processo civilizatório da humanidade. Para um autor que buscava não se limitar a um viés sociológico ao tratar do Brasil, foi bem oportuno ter encontrado autores com métodos que enfatizavam a dissecação da História. Não por acaso, são justamente as passagens mais narrativas de "Raízes" que tornam o livro tão genial.
Até coisas tão visíveis na atualidade, como a valorização das carreiras de Medicina e do Direito, surgiram em nossa mãe-pátria. O desprezo pelo esforço levou os portugueses a apreciar as profissões liberais, que eram perfeitas para ostentar erudição e evocar aristocracia. A própria burocracia patrimonialista que tanto age de maneira parasita no Estado brasileiro tem parte de suas origens na confiança dada a leis exageradamente abstratas e detalhistas, que até constrastam com o estilo totalmente realista e naturalista dos portugueses. Uma negação da própria cultura constituída por eles, de acordo com o ensaísta.
Até mesmo o Classicismo lusitano simbolizou uma malfadada tentativa de modernização cultural em Portugal. A expansão marítima (a propósito, desmistificada por Sérgio Buarque, que expõe o seu lado austero), que inicialmente enriqueceu (e muito) tal povo, acabaria sendo também a sua ruína, ao incitar a ganância, a prática perdulária e a assimilação de reacionários valores dos nobres pela burguesia levaram a uma agonizante decadência econômica de nossos "achadores". Nas palavras do próprio 'pai do Chico', "Em Camões, a tinta épica de que se esmaltavam os altos feitos lusitanos não corresponde tanto a uma aspiração generosa e ascendente, como a uma retrospectiva melancólica de glórias extintas. Nesse sentido cabe dizer que o poeta contribuiu antes para desfigurar do que para fixar eternamente a verdadeira fisionomia dos heróies da expansão ultramarina."
Conclui-se, portanto, que, entre tantos outros fatores, a contribuição dos portugueses na elaboração da cultura brasileira foi fundamental. Até mesmo a natureza "cordial" (origem do 'jeitinho brasileiro'), em oposição à polidez de, por exemplo, japoneses e anglo-saxônicos. O leitor fica até surpreso por encontrar tantas semelhanças, especialmente nos capítulos finais. Aliás, no último deles o autor tenta expor uma possível solução para os problemas do Brasil, e deixa bem claro que só conseguiríamos o tão almejado desenvolvimento na hipótese de erradicarmos o culto personalista, a tendência ao comodismo e - como eu disse em um texto passado, e vi uma opinião análoga da parte do escritor - a falta de ambição. Do contrário, a estagnação nos aguarda calorosamente.

 

Comentários:

 

 

aha, ai esta um final perfeito pra sua redacao sobre o brasil :)
"do contrario, a estagnacao nos aguarda calorosamente"... gostei!


Buarque era um fascista eurocêntrico!
Gilberto Freyre tem muito mais calibre pra falar de Brasil.
No mais, bom texto.


Postar um comentário

[ << Home]