Maaaaaais uma vez, a "esquerda na América Latina" como tópico.
Os argumentos utilizados pelo autor do texto, Renato Pompeu, e pelo entrevistado, Nildo Ouriques, foram os que eu já esperava de um partidários das "causas canhotas": a apologia a um Estado mais forte; a condescendência com os mandos e desmandos de Chávez; a ignorância do fato de que uma economia "monocultora" (no caso venezuelano, com o petróleo) tem pouquíssimas chances de progresso a médio e longo prazo; a tentativa patética de desconsiderar PT e Lula como esquerdistas (fica até parecendo que, para eles, é IMPOSSÍVEL que um governo austero, pragmático e moderado seja bom); o velho argumento criticando o imperialismo dos EUA (isso é tão clichê, parece coisa típica de gente que pára de comer no McDonalds porque eles são uma empresa capitalista-cruel-monopolista, rs); a retórica ingenuamente radical (como se mudar a Constituição na marra, fazer o Executivo controlar o Legislativo e incitar a desordem popular fossem resolver a situação de um país subdesenvolvido, hehe)...
Mesmo quando eu tinha idéias de esquerda, fugia dos radicais. Tanto que só li a Caros Amigos por uns três, quatro meses naquela época, depois cansei da revista. Eles são quase surreais em suas colocações, ao ponto até de distorcerem argumentos para usá-los ao seu belprazer. Por exemplo, citaram no texto que Norberto Bobbio conceituou a esquerda como "a defensora da justiça social e do bem-estar" e a direita como a "conservadora dos interesses das elites". Duvido que Bobbio, um tão conceituado estudioso sobre Política, Economia e Direito, tenha resumido a questão ideológica de uma maneira tão imbecil e simplista, como se fossem palavras ditas por um menino de sétima série que foi manipulado pelo seu professor de História que é socialista. Certamente o autor de tal texto na revista deturpou os conceitos de Bobbio, para criar uma dicotomia Bem x Mal que nunca existiu na oposição entre direita e esquerda.
O meu conceito não é lá dos melhores, mas, na minha concepção, associo a direita à crença na liberdade e no respeito à individualidade, assim como a esquerda aos que colocam a igualdade e a coletividade em primeiro lugar. Não chega a ser um dualismo economia x social, até porque ambos os lados se preocupam, de maneiras diferentes, com tais assuntos. A diferença são os meios empregados e objetivos visados, mas os fins são quase os mesmos - o bem-estar (não importando se ele seja individual ou coletivo) e a paz (mesmo que temporária).
No caso de ditaduras, cada uma delas coloca as suas prioridades - vide Mário e Silas, Fidel e Pinochet, Mao-Tsé e Suharto, Stálin e Hitler, Chávez e Fujimori... para uns, uma economia livre e aberta é o mais importante; para outros, a preocupação maior é com a desigualdade sócio-econômica. Uns querem combater a inflação; outros, o desemprego, mas ambos querem o crescimento.
O raciocínio da esquerda é mais dedutivo - a idéia precede a experiência - , enquanto seus rivais são indutivos - a experiência demonstra uma idéia. É só comparar Adam Smith com Karl Marx para ver isso de uma maneira mais abrangente. O liberal old-school detectou que a realidade estava se comportando de uma determinada maneira, e resolveu sistematizar isso no papel. O socialista científico analisou o mundo e propôs como ele deveria ser. Não que uns sejam os idealistas e os outros os realistas (até porque, no mundo atual, parece que os 'destros' andam mais utópicos, por incrível que pareça), mas suas maneiras de encarar os problemas da sociedade vão por princípios, éticas e prioridades diferentes.
Então, a melhor coisa seria uma 3ª via, um centrismo, certo? Errado. Os nacionalistas, pela sua adoração quase doentia pelas suas nações/culturas/etnias, são muito mais perigosos que os dois pólos, até porque se apropriam de elementos de ambos para tornar suas ideologias e ações mais enfáticas. O exemplo mais extremo disso é o próprio Adolf. Nazismo vem de Nacional-Socialismo e eles eram economicamente intervencionistas à la keynesianismo, mas a burguesia era a estrutura de sustentação do poder e eles eram mais anti-comunismo do que anti-capitalismo. Vargas, Cromwell e Napoleão também agiram como conciliadores em seus respectivos contextos, e isso fez deles bem mais cruéis do que poderia se imaginar, pois, quando um político chega ao poder sem um lado propriamente definido (ou com o apoio de forças heterogêneas), é quase inevitável que ele reforçará a sua imagem para "unificar" o discurso. Isso já é um grande passo rumo ao despotismo.
Conclusão? Não há conclusão para esse assunto. Eu continuarei a me simpatizar com a centro-direita na economia e com os libertários na parte sócio-política, assim como vocês, leitores, vão manter suas posições por muitos anos ainda. Eu apenas defendi uma tese usando meu estilo anfisista (ou seja, "buscando o equilíbrio sem estar em cima do muro" - epa, isso é querer conciliar interesses... mas não é novidade para ninguém que eu sou um totalitário em potencial, hehe) e não espero convencer ninguém com meus argumentos. No fundo, estamos discutindo uma relatividade, questões que "dependem do referencial", mas que nem por isso deixam de ser oportunas - aliás, o são desde que gregos e romanos organizaram mais amplamente o que veio a ser chamado de Política. Roma, Atenas e Esparta ainda estão em nossos corações e mentes.