Egoperspectivismo
O primeiro é este que vocês estão a ler, chamado Egoperspectivismo.
Vocês devem ter estranhado esse nome. "Egoperspectivismo? Que diabos é isso?" Bem, é um termo que eu criei para definir uma nova teoria da minha linha de pensamento. Consiste em trabalhar um assunto ou tema com vários pontos de vista, visando a constituir uma análise idiossincrática a partir deles. Ou, como eu defini para uma amiga minha:
"(...) creio que consistir-se-á em analisar uma mesma situação sob 2 ou mais pontos de vista, (...) mas sem deixar de contextualizar-se, e, como o 'ego' sugere, submetendo até mesmo a realidade do futuro ou passado da qual se deseja analisar à sua própria visão de mundo, sem negar a subjetividade."
Para não deixar que tal palavra se limite a (mais) um pedantismo, vamos a uma aplicação prática. Já que estou bem empolgado com a leitura de duas das quatro obras da tetralogia de Elio Gaspari sobre o regime militar (já li "A Ditadura Envergonhada" e comecei anteontem a ler "A Ditadura Escancarada"), discutirei qual posicionamento eu tomaria em relação à crise política de 1964, que levaria à Revolução (?) de 1º de Abril.
Acredito que não precisarei falar sobre os antecedentes históricos; vamos direto ao ponto.
1. Se, naquela época, eu tivesse contato com as obras de escritores como Kerouac, Hayek e Friedman, e meu pensamento político e econômico fosse ligado à direita libertária, provavelmente eu não apoiaria o golpe. Não aceitaria sacrificar a minha liberdade de expressão em troca de uma ameaça (concretizada, aliás) de autoritarismo e repressão. É claro que a polarização ideológica complicaria uma possível neutralidade de minha parte, logo há a possibilidade de eu preferir o exílio a ficar em um Brasil regido por uma ditadura, independentemente de ela ser capitalista ou socialista. Destino? Inglaterra, quem sabe. De quebra, eu teria a oportunidade de viver por lá na época em que o rock deles teve uma ascensão brilhante, contando com bandas como The Who, The Kinks, Rolling Stones e, é claro, Beatles. Se eu não tivesse dinheiro para tal viagem, ficaria no Uruguai ou no Chile, pelo menos até ter condições de partir para a Europa.
2. Não descarto a possibilidade de que eu seguiria a maioria dos intelectuais da época, e me alinharia aos socialistas. Talvez simplesmente fosse da esquerda festiva, mas não duvido quanto a uma filiação ao PCB e um apoio à radicalização que Jango ensaiava. Mesmo assim, discordaria do populismo radical de Brizola ou a russofilia de Prestes, preferindo um modelo socialista mais heterodoxo. Quem sabe eu não seria um estudante à moda dos franceses e tchecoslovacos de 68? Sim, eu poderia até virar algum jornalista escrachado, como os do Pasquim. Mesmo assim, quanto a algo eu tenho certeza: eu não integraria a luta armada. Não é a minha praia pegar em armas para fazer uma revolução. Acho que também não participaria do Congresso da UNE de 68, por temer que a polícia acabaria descobrindo o sítio em que ele seria realizado. Mesmo assim, continuaria atuando na política por outros meios.
3. E se eu fosse direitista, mas liberal? Ah, certamente discordaria dos rumos do governo de Jango, admitindo até mesmo um golpe para "limpar a casa". Até gostaria da política econômica de Bulhões e Roberto Campos, desenvolvida durante o governo de Castello Branco. Acabaria por condicionar meu apoio à ditadura à continuidade desse liberalismo na economia. Entretanto, quando Delfim Netto entrasse em cena e começasse com as obras faraônicas e o capitalismo de Estado, sem dúvidas eu ficaria decepcionado. Talvez continuasse no país, em um silêncio constrangedor - assim como muitos liberais à epoca -, ou poderia filiar-me ao MDB, vislumbrando uma abertura a médio prazo.
E então, qual a conclusão à qual eu chego? Oras, eu não iria para nenhum dos dois pólos - não apoiaria os militares, tampouco a extrema-esquerda.
Se eu colocasse a liberdade em primeiro lugar, preferiria o exílio voluntário; se a justiça social fosse a minha prioridade, estaria do lado dos esquerdistas mais moderados; e se uma economia mais aberta fosse o que eu mais desejasse, não teria escrúpulos em tolerar por algum tempo a ditadura, mas mudaria de idéia quando o AI-5 entrasse em cena.
Em outras palavras, Kaio poderia estar de três maneiras no ano de 1968: I - Curtindo a vida em Londres, participando de manifestações dos libertários; II - Na clandestinidade, escrevendo em algum jornal nanico; III - Na faculdade de Economia, desiludido com os rumos da ditadura.
E vocês, onde acham que estariam em 68?