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01 abril 2014

Reflexões sobre o desfecho de How I Met Your Mother

(SPOILER ALERT: Este post contém inúmeras revelações sobre os eventos dos dois episódios finais de HIMYM. Não leia se não quiser estragar a surpresa.)

Era para eu ter escrito ontem um texto sobre tudo o que aconteceu de bom e de ruim comigo ao longo do mês de Março (um dos mais intensos da minha vida, diga-se de passagem), mas isso fica para depois. Ontem passei o dia inteiro pensando, lendo e assistindo a How I Met Your Mother, e no fim da noite vi os episódios finais com minha namorada e três amigos. "Last Forever - Part One" e "Part Two" são tão impactantes - além de polêmicos e controversos - que me senti impelido a dar minha interpretação sobre eles.

Comecei a assistir à série em Janeiro de 2011, quando ela já ela estava em sua 6ª temporada. Eis um tweet que postei na época: "Uau, em menos de 10 dias já descobri um 3º seriado legal para acompanhar: How I Met Your Mother.  Funny, e os personagens são carismáticos." Cinco dias depois, uma nova mensagem mostra que não demorou muito para eu ser fisgado pelo romantismo da série: "Grrr, os 2 últimos eps. de How I Met Your Mother que eu vi (1x12, 1x13) foram tão românticos que me "contaminaram". Odeio quando fico meloso".
Para quem não lembra, é no 13º episódio ("Drumroll, Please") que Ted conhece Victoria, e a forma como ocorre o primeiro encontro deles é tão bonita que resolvi dar um tempo em HIMYM; pressenti que seria doloroso ver como um relacionamento que começou tão bem iria necessariamente acabar mal, afinal provavelmente Victoria não seria a mãe. (Aliás, é no mínimo intrigante ter descoberto ontem (!) que, na verdade, ela poderia sim ter sido "The Mother": esse era o plano dos criadores, caso a série fosse cancelada após a primeira temporada.)
Enfim, passei alguns meses sem ver a série - e admito que um motivo para isso foi meu platonismo, pois na época eu estava em um momento difícil da minha vida de solteiro, amargurado pelo desejo de ter um relacionamento sério e duradouro. O fracasso do meu 1º namoro, em meados de 2009, não me marcou como desilusão amorosa; pelo contrário, me deixou ainda mais esperançoso de que as coisas poderiam dar certo com uma nova namorada.
O destino quis que, em Agosto de 2012, já morando no Rio de Janeiro, durante uma sexta-feira em que eu estava assistindo a alguns episódios da 4ª temporada (aliás, após uma nova pausa - e, por engano, vi o episódio "Not a Father's Day" antes do "Happily Ever After", portanto soube que a Stella deixou Ted no altar de forma indireta, e só depois assisti a como tudo ocorreu, rs), eu fosse em uma festa na qual fiquei com uma garota com quem passei horas conversando depois que a boate fechou. Ironicamente, uma das primeiras coisas que eu disse para ela no caminho - depois, é claro, de perguntar se ela já tinha ouvido falar em How I Met Your Mother - foi "Estou numa fase da minha vida em que quero parar de ser como o Ted e agir mais como o Barney". Em outras palavras, eu estava de saco cheio de tentar um relacionamento sério (dois meses antes, meu 2º namoro também acabou mal), e estava tentando ser um rapaz solteiro "normal", que fica com várias meninas sem ficar pensando em compromisso.
No dia seguinte, vi vários episódios de HIMYM e pensei que terminaria minha noite de forma pacata, mas um amigo me chamou para uma outra festa; de repente tive a idéia de chamar a menina da noite anterior para ir comigo e, por sorte, ela aceitou. Kids, that's how I met my girlfriend!
De tanto eu insistir, Carolina começou a assistir à série, o que me permitiu rever os episódios (foram muitas maratonas!) e notar o quanto How I Met tinha a ver com nosso relacionamento, desde coincidências da nossa história com a da "mãe" e Ted até semelhanças entre nós e o casal Marshall & Lily. (Meses depois fizemos um teste no Zimbio que confirmaram que "somos" estes dois personagens.) Isso me levou a pronunciar, certo dia, uma frase que define a importância da Carol na minha vida: "Estava tentando ser menos parecido com o Ted e mais com o Barney. Acabei virando Marshall".

Fiz todo esse prefácio para finalmente chegar à análise de "Last Forever". (Mais uma vez aviso: spoilers a seguir!) Se HIMYM já era conhecido por seu enredo cheio de reviravoltas, os quarenta minutos finais da série levaram essa premissa às últimas conseqüências:
1) Após três temporadas "construindo" o casamento de Robin e Barney (sendo que a última delas se passou inteira durante os 3 dias da cerimônia), é revelado que, apenas três anos depois, o casal se divorciou. O principal motivo para o término foi a prioridade que Robin deu à sua vida profissional, viajando pelo mundo inteiro para fazer suas coberturas jornalísticas. Barney se cansa dessa rotina e, cumprindo seu voto de que sempre seria sincero a sua esposa, confessa que está insatisfeito, e ambos terminam amigavelmente - bem, não tanto quanto no break-up anterior (no 7º episódio da 5º temporada, em 2009), pois Robin começa a se afastar cada vez mais do grupo de amigos. Porém, há um outro motivo para esse distanciamento...
2) ... que é o fato de que ela percebe o quanto ama Ted e o quanto dói vê-lo tão feliz com Tracy (eis o nome da mãe!). Uma tragédia, entretanto, muda tudo: após 11 anos de relacionamento, 4 anos de casamento e 2 filhos, Tracy é acometida por uma doença terminal (não é especificada qual, mas imagino que tenha sido algum câncer) e morre em 2024. Após seis anos de luto - eis a grande revelação deste episódio final -, Ted conta a seus filhos a história de "como conheci sua mãe", mas segundo eles próprios aquilo soou mais como "ainda sinto algo por sua tia Robin". Penny e Luke dão a seu pai o aval para tentar retomar a relação com sua ex-namorada, agora que ambos já conquistaram aquilo que antes os impedira de continuar o namoro: seus interesses conflitantes (Ted se casou e teve filhos e Robin já viajou pelo mundo inteiro e alcançou sucesso profissional).
3) Para completar, Barney "regride" ao estilo de vida promíscuo e playboy que o caracterizava antes de seu amadurecimento emocional, a partir da 7ª temporada, o qual floresceu em seus relacionamentos com Nora, Quinn e Robin. Ele, contudo, abandona esta persona de "player" quando descobre que uma das garotas com quem teve one-night stand está grávida - e de uma menina! Barney volta a "evoluir", passando a ser menos misógino. Achei muito bonito o que ele disse quando segurou pela primeira vez sua filha Ellie: "Você é o amor da minha vida. Tudo que tenho... e tudo que sou... é seu. Para sempre."
4) Por sua vez, Marshall e Lily têm um terceiro filho. Além disso, após cinco anos desde que desistira de ser juiz para viajar para a Itália e comemorar a segunda gravidez de Lily, Marshall é chamado novamente para ser juiz; e, em 2020, "Marshmallow" ganha a eleição para a Suprema Corte. "Lawyered!"

Ao longo dos últimos meses, a teoria de que a mãe estaria morta ganhava cada vez mais força nos fóruns da internet; mesmo assim, muitos fãs duvidavam que a série poderia ter tal desfecho, e consideravam que tudo não passava de "conspiração", de especulação mórbida. Eu mesmo era um deles, como demonstra este comentário que fiz ontem no Facebook, em resposta a uma amiga: "você leu a teoria do "The Mother is dead"? Eu achei meio viajada (e inverossímil, afinal seria uma maneira extremamente depressiva de acabar a série), embora episódios como "Tive Travelers" e "Vesuvius" dêem subsídios para ela.
Sobre os episódios mencionados: no primeiro deles Ted faz um discurso extremamente triste sobre o fato de que gostaria de ter passado 45 dias a mais com "a mãe": 


Já em "Vesuvius" há várias pistas: 1) a mãe diz a Ted que ele não pode mais viver em suas histórias, pois precisa seguir em frente ("life only moves forward"); 2) ao se lembrar de que o casamento de Barney & Robin foi uma das últimas ocasiões em que todos os cinco amigos estiveram juntos, Ted consola-se ao pensar que é melhor aproveitar os momentos enquanto você ainda pode, e assim deixar algumas coisas não-ditas ("it's best to leave it unspoken"); 3) quando seu marido se refere ao fato de que a mãe de Robin finalmente apareceu no hotel, Tracy brinca: "Que tipo de mãe iria perder o casamento da própria filha?". Ted reage de forma bastante emotiva, como se tal frase fosse premonitória:




Os cinco minutos finais da série confirmaram as teorias (e temores) dos fãs. O tom nostálgico de Ted ao se referir à mãe, combinado com um "slide-show" de momentos importantes que passaram juntos (e com os filhos), me preparou para o pior. Eis que ele diz, após explanar sobre a importância de perseverar no amor a despeito de todas as brigas e desentendimentos: "Eu carreguei essa lição comigo. Carreguei até mesmo quando ela adoeceu. Até lá, no que podemos chamar de pior dos tempos, tudo o que eu conseguia fazer era agradecer a Deus (...) por ter encontrado aquela garota linda, naquela plataforma de trem, e por ter tido coragem de me levantar, caminhar até ela, e tocar seu ombro,  abrir a minha boca, e falar." Foi um final emocionante. 
Muitos, no entanto, não gostaram desse "plot twist"...

Este texto foi profético sobre como seria a reação de muitos fãs caso "The Mother is dead" fosse mais do que uma especulação: "Really, this could all be a big, misleading twist. Just for fun, though, can we just step back and imagine what the Internet will do if it reveals that after nine seasons of Ted telling the tale of How He Met Their Mother to his future kids, it’s all because the mom is dead? It would be a triumph for conspiracy theorists everywhere, but Internet commenting systems might actually explode. If there’s one thing you don’t want to do, it’s make an obsessed fandom feel like they’ve wasted their time (still thinking of you, “Lost”) — and that’s how many would feel if the producers revealed that the end of a glorious love story is actually a completely depressing tale of death."

Nas últimas horas li textos extremamente agressivos, criticando o desfecho de How I Met Your Mother. Compreendo a sensação indignada de muitos fãs, afinal não foi o "final feliz" que se esperava; porém, acredito que é justamente por isso que gostei tanto dele: foi corajoso, ousado. Destruir as expectativas dos telespectadores dessa maneira pode render, por exemplo, a acusação de que unir Robin e Ted foi um "cheap trick"; mas, peço que os detratores façam o seguinte: assistam novamente ao primeiro episódio da série. Creio que um dos motivos pelos quais adorei o final foi justamente porque havia decidido rever o piloto de HIMYM ontem, enquanto almoçava. Poucas vezes a estréia de uma série cresceu em importância à medida que ela avançava. A chave para entender o porquê desta comédia dramática ter terminado com o casal Ted & Robin reside no fato de que How I Met começou justamente enfatizando o quanto os dois combinavam, o quanto tinham uma notável química: 



Mesmo que o narrador termine o episódio-piloto deixando claro que ela não é a mãe mas sim a "tia Robin", é impossível acreditar que as coisas parariam ali. Ted precisou de nove temporadas para "esquecer" Robin, mas foi graças a esse processo de superação que este personagem se tornou maduro o bastante para "estar pronto" para encontrar o amor de sua vida, Tracy. Depois que sua esposa morreu, Ted passou por um longo período de luto até perceber que, viúvo aos 52 anos de idade, ele merecia a chance de ainda (tentar) ser feliz. O amor eterno jurado à "mãe" não o obrigava a passar o resto da vida sofrendo, se martirizando com o próprio passado - e esse "siga em frente" foi algo que a própria Tracy pediu para que ele fizesse: "I don't want you to be the guy who lives in his stories."
Para aqueles que ainda não estão convencidos do pleno sentido que a morte da mãe faz para o enredo da série, eis algo que ela diz no famoso episódio "How Your Mother Met Me":



Portanto, também ela passou pela perda traumática do amor de sua vida (Max), e demorou seis anos até decidir namorar novamente. Porém, foi preciso tomar uma decisão mais radical ainda: ela recusou o pedido de casamento de Louis porque sentia que aquele relacionamento ainda não era o bastante, era "casual", não tinha a consistência que ela precisava para que realmente considerasse que havia superado o luto. Eis que, na noite seguinte, ela conhece Ted, sua "segunda chance no amor", e ele foi um companheiro maravilhoso para Tracy nos 11 últimos anos da vida dela.
O ponto central da trama não é, portanto, "como conheci a pessoa perfeita para mim", mas sim "como superei a perda de alguém que eu amava e estou me dando uma segunda chance de ser feliz". Um comentarista do A.V. Club explicou bem isso, relacionando este tema com a cena acima: "A scene that also takes on additional weight in retrospect is when Tracy breaks off her relationship and asks her deceased ex for permission to move on. Her decision to move on with her life and try to find happiness does not detract from her love for him. Likewise with Ted, she did not want him to "live in his stories" and she would have given him permission to be able to move on and explore a life with Robin. It does not take away from his love for Tracy. This is the story of him six years later thinking back on his younger life and deciding it's not too late to give Robin another chance."
Este outro comentário feito por um dos fãs no A.V. Club sintetiza bem o que eu penso: "The show was never really about meeting the mother. They said that many times- it's about the journey. Just because he gets with Robin TOO doesn't mean his journey to meet Tracy, THE MOTHER OF HIS CHILDREN, isn't equally important. It's about how it's not about the "one" or even about the perfect person. Robin and Ted would never get married before: he wanted and needed kids and she needed to travel and be independent. If Ted had met Tracy when he met Robin, he was not the man he needed to be.
Para encerrar as "referências bibliográficas", este belíssimo texto de Donna Bowman - mesmo tendo sido escrito antes de ela ver o episódio final - também enfatiza que a série é sobre amadurecimento, tanto afetivo quanto num sentido mais amplo.
Cabe afirmar também que HIMYM já havia lidado anteriormente com o tema da mortalidade, e sempre de forma tocante; por exemplo, a morte do pai de Marshall (6ª temporada), ainda mais por ela ter ocorrido no mesmo dia que o marido de Lily havia descoberto que seria pai pela 1ª vez. É raro ver uma comédia com tamanha capacidade de emocionar:


O final de How I Met Your Mother é do tipo "ame ou odeie", e vai continuar a dividir opiniões por muitos anos. De alguma forma, contudo, eu prefiro um final assim do que um feito na medida para agradar aos fãs, como o de Friends. A ousadia dos criadores de HIMYM me fez lembrar de outro desfecho inusitado: o de Seinfeld, que "cuspiu" na cara dos fãs ao mostrar que os quatro protagonistas eram cínicos e misantrópicos, e portanto mereciam ser "punidos" por anos e anos de comportamento abertamente anti-social.
É claro que muita gente que acompanhou a série estava movido pela expectativa de que haveria muitos episódios sobre "a mãe", e que portanto o título do seriado deveria ser tomado ao pé da letra; mas, esta nunca foi a intenção dos criadores. O fato de que o final de How I Met já estava roteirizado em 21 de Fevereiro de 2006 deixa claro que, já em seus primórdios, HIMYM é a história da superação, pelo protagonista, da perda da "Mother", e uma investigação autobiográfica que permite a redescoberta de um amor antigo. Robin e Ted finalmente estão maduros e livres para serem felizes para sempre. Ambos tiveram suas auto-realizações (ela no trabalho - e, durante algum tempo, no casamento com Barney; ele, na vida conjugal com Tracy e nos dois filhos que tanto queria ter); agora que estão solteiros na meia-idade, por que não tentarem novamente um relacionamento? Nossa vida é muito curta para ficarmos eternamente atormentados pelo passado, assombrados pelas lembranças de bons tempos que não voltam mais. Sendo assim, vale a pena arriscar; mesmo que dê errado, é melhor tentar do que não fazê-lo e passar o resto dos dias em amargo arrependimento. Creio que esta é uma bonita lição de vida, e que atenua qualquer morbidez que possa haver no final da série.

 

Comentários:

 

 

Excelente análise! Muita boa mesmo!

Uma coisa que aprendi foi que às vezes conhecemos a pessoa certa no momento errado. Vocês combinam, se gostam, mas possuem interesses divergentes na vida.

E para vocês valorizarem o que possuem, precisam viver outras e novas experiências justamente para amadurecerem e conseguirem ter o relacionamento saudável que tanto queriam.

Ted e Robin é um casal que só seria possível após Tracy. Até para os dois perceberem o quanto um significava pro outro.

Gostei muito da sua comparação da vida pessoal com a série, deu um ar de mais verossimilhança pro depoimento. Excelente texto, parabéns! :)


Ficou muito boa mesmo (reiterando o comentário do Kim, rs)!

Realmente, todos os fatos do episódio fazem muito sentido e os produtores tiveram excelentes sacadas para o final. Conseguiram fugir de um desfecho óbvio logo de cara (que o Ted e a Robin fossem terminar juntos e ela fosse a mãe) para depois conseguir retornar a isso de um jeito inusitado e inteligente.
Relembrando os episódios em que eles estavam juntos, dava para ver mesmo que combinavam bem... (e se você for lembrar, foi a Lily que começou a intriga que os separou).
Acho que nunca assisti um seriado em que os personagens fossem tão apaixonantes e em que eu torcesse tanto para que eles se tornassem pessoas melhores, como de fato aconteceu. Foi emocionante acompanhar a trajetória de todos os personagens, e aprender com suas lições.
Esse seriado realmente foi marcante para nós dois. Fico muito feliz por ter te transformado num Marshal, e por ser sua Lily, rs :)
Parabéns pelo texto (excelente análise mais recapitulações que explicam as cenas finais) e obrigada por me mostrar o seriado!


Cara desde que vi o final ontem procuro textos que amenizem a raiva que eu senti, pois quando vejo uma série, ou me empenho em qualquer coisa só quero o que penso ser o melhor. Realmente você está certo, Ted se esconder da vida para sempre sem se dar a chance de ser feliz pq o grande amor da sua vida e foi seria triste também. Muito pensei e fiquei com a ideia que a Robin não merece o Ted, mas a Robin que a gente viu, não essa de 2030.

Mesmo assim, começando a aceitar esse fim, espero o alternativo e tomara que a mãe fique viva, pois sua personagem supera qualquer expectativa do que esperávamos, e merece um fim mais justo! Tomara!


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