2011 não foi o melhor ano da minha vida, mas está longe de ter sido o pior. O ápice foi no mês de outubro (vide este post), mas o resto do ano também foi povoado por bons momentos, sobre os quais falarei mais adiante.
Comecemos esta retrospectiva por quatro tópicos:
1 - Política e Ideologia: depois de uma empolgante meia-semana em Porto Alegre, com o Seminário de Economia Austríaca e o Fórum da Liberdade, eu voltei para Brasília com muita esperança e mais de 10 livros de autores libertários/liberais na bagagem (foi até difícil carregar tudo na volta para casa, rs). Pensava que nós, adeptos do libertarianismo, tínhamos a “luz”, e o que o resto do mundo, principalmente os esquerdistas e pós-modernos, precisavam ser desafiados e refutados. Estava tão animado com o grupo que havia conhecido na capital gaúcha (isto é, o pessoal do LIBER e do Mises Brasil) que até me filiei ao "partido em potência" e me comprometi a ajudar na coleta de assinaturas em Brasília.
Não demorou mais do que alguns dias para que batesse a desilusão. Fatiguei-me com a maneira binária de muitos libertários encararem a realidade, como se tudo se reduzisse a Estado x Mercado, governo x livre-iniciativa, políticos x empreendedores. Aquela crítica que fazem a pensadores como Ayn Rand e Rothbard finalmente começou a fazer sentido: o individualismo extremado deles passou a me soar desagradável, ainda mais depois de eu ter passado um ano e meio imerso nos clássicos humanistas. Além disso, incomodei-me com o "purismo" dos libertários, que rejeitam qualquer um que fizesse a mínima concessão aos "outro lado": os intervencionistas/estatistas, sejam eles socialistas, conservadores ou até mesmo social-liberais. Parece até "trotskismo de direita", como se houvesse uma competição para ver quem é mais intransigente na defesa do livre-mercado.
Além disso, preocupava-me com o "vale-tudo moral" do libertarianismo. Pode até parecer caretice da minha parte, mas acho que falta uma preocupação com a ética - no sentido aristotélico mesmo - no pensamento libertário. Não que seja preciso chegar aos extremos do neoconservadorismo (que, muitas vezes, são hipócritas e falsos moralistas), mas acho igualmente prejudicial o hedonismo que a mentalidade anarco-capitalista pode ter quando aplicada às relações pessoais.
Esses dilemas me fizeram até pensar em me desfiliar do LIBER; não o fiz, mas estou pouco ativo no projeto. Ainda sou libertário, mas sem a mesma empolgação e “calor” que já tive em outras épocas. Meu fervor ideológico quase reacendeu depois da palestra dos professores Paulo Kramer e Antonio Paim sobre Liberalismo, em agosto na UnB; porém, como nos dias seguintes tive que estudar para a prova do mestrado, nem tive tempo para me dedicar a isso. Porém, no fim de outubro, a surpreendente vitória da chapa Aliança pela Liberdade nas eleições para o Diretório Central dos Estudantes proporcionou uma situação assaz curiosa: no meu último semestre de graduação, finalmente a esquerda foi desalojada da liderança do movimento estudantil! Tornei-me coordenador de integração estudantil, cabendo a mim iniciar a construção de um modelo parlamentarista para o DCE. Porém, embora o grupo fosse composto por muitos liberais, minha empolgação com a "causa libertária" não ressuscitou; pelo contrário, o viés pragmático da gestão da Aliança só reforçou minha "desideologização".
Acredito, no entanto, que posso viver bem sem essa "militância", afinal minha utopia social vislumbra justamente um mundo em que eu possa me preocupar com outras coisas para além de política e economia. Em outras palavras, ambiciono viver em uma sociedade na qual eu possa me dedicar integralmente à minha formação cultural e intelectual, à minha Bildung. Seria algo como a Atlantis de "A Revolta de Atlas", só que menos economicista, ou como a Davos-Platz de "A Montanha Mágica", só que virada ao avesso, sem aquele clima de enfermidade.
2 - Relacionamentos: passei mais um ano em branco - não namoro há mais de dois anos. Talvez seja por minha timidez - ou mesmo preguiça - de tomar a iniciativa, de “correr atrás”. Também pode ser porque não encontrei nenhuma garota que me interessasse tão profunda e intensamente ao ponto de eu me sentir obrigado a sair da inércia.
Em 2011 até me "forcei" a gostar de duas meninas (e simultaneamente! Pela primeira vez na minha vida fui um platônico promíscuo, rs), porém em nenhum dos casos a relação passou do status de amizade. Com uma delas (chamá-la-ei de crush #1) gosto de sair para shows de rock e conversar sobre cultura pop, mas ela tem um defeito: é esquerdista, o que me faz evitar assuntos políticos, hehe. Com a crush #2 as conversas são sobre os mais diversos assuntos (desde coisas engraçadas que lemos/vemos na internet até assuntos mais filosóficos e/ou intimistas), mas como ela mora longe quase não saio com ela. Não creio que faço o "tipo" de nenhuma das duas, então me conformei em ser um bom amigo.
Curiosamente, 2 das 3 garotas com quem fiquei neste ano tiveram relação com o insucesso de minhas duas crushes. Para a #2, porque em março, horas antes de ir para a Cult 22, soube que ela tinha ficado com um amigo meu; eu me “vinguei” - ou, usando um termo menos patético, me "redimi" - ao ficar com uma garota mais velha lá na Communist Party*. Para a #1 , pois ela foi embora muito cedo da festa em que nos conhecemos - só deu tempo de dar um selinho nela - e, poucos minutos depois, uma outra menina começou a dar em cima de mim.
* [Em abril, até saí com esta "older girl" mais três vezes; jogamos sinuca na Área 51, fomos na Livraria Cultura e vimos dois filmes no cinema ("O Retrato de Dorian Gray" e "VIPs"). Porém, embora ela fosse mestranda em Sociologia e tivesse bom gosto musical, não me interessei tanto por ela, e não quis ir além do 3º encontro.]
Por sorte, quando eu menos esperava, fiquei com uma 3ª garota no penúltimo dia do ano. Ela era legal e extrovertida, mas provavelmente nunca mais a verei; I believe it was just a one-night kiss. Um fato curioso é que mantive a minha tradição de só ficar com mulheres mais velhas do que eu; mesmo a minha ex-namorada era, embora com a menor diferença registrada até agora (28 dias mais velha). Será que eu tenho "síndrome de Mrs. Robinson", rs?
3 - Vida de Universitário: comecemos por um desabafo - parece que só eu continuo me importando com o projeto Estudos Humanistas. Por mais que os 4 anos de UnB tenham sido maravilhosos, infelizmente não encontrei nenhum/a universitário/a com o mesmo perfil acadêmico que eu, i.e., voltado para a leitura e discussão dos clássicos da cultura ocidental. Meus amigos liberais/libertários estão mais preocupados em trabalhar e ganhar dinheiro; os conservadores, embora até fossem nos colóquios, demostraram ser profundamente arrivistas e megalomaníacos, ainda mais na época da eleição para o DCE; o pessoal do PET era muito socialista e pós-moderno para serem parceiros intelectuais compatíveis; já os meus demais amigos e colegas, por mais gente-boa que sejam, são mais companheiros de festas do que de estudos.
Repeti a sina que me marca há anos: identifico-me mais com meus docentes do que com os colegas da minha faixa etária. Pessoas com o meu "profile" são todos professores. Pelo visto meu futuro passará inevitavelmente pela carreira acadêmica. Só espero que no futuro eu conheça mais "humanistas", porque ser o único do departamento (ou da universidade) com estas preocupações/motivações seria algo bem frustrante.
Porém, 2011 também reservou boas notícias: passei no mestrado, a Aliança pela Liberdade ganhou as eleições para o DCE, formei-me no prazo que tinha estabelecido (quatro anos) e fiz várias novas amizades em pleno último semestre de UnB. Não fui em tantas festas como em 2010, mas mesmo assim estive em algumas muito boas (London Calling em 22/Janeiro, Communist Party em 26/Março e 3/Setembro, Festa da Arquitetura em 22/Outubro, Play em 30/Dezembro etc.)
Li ótimos livros; o melhor deles foi “Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister” (Goethe). Fiz uma leitura bem cuidadosa dele: 20 páginas de fichamento, além de ter lido outros livros que o analisavam, como “O cânone mínimo” de Wilma Patrícia Maas. Destaque também para aquele com o qual comecei o ano lendo e terminei 2011 fazendo dele tema de um artigo: “Doutor Fausto” (Thomas Mann), que é quase tão perfeito quanto “A Montanha Mágica”. Completo o top 5 com os “Ensaios” de Montaigne, “Nobreza de Espírito” (Rob Riemen) e “A Vida Intelectual” (Sertillanges). Bret Easton Ellis, que já havia sido spotlight em 2010 com “Os Jogos da Atração”, neste ano manteve meu contato com a literatura contemporânea com suas obras “Abaixo de Zero” e “Suítes Imperiais”. Dentre as releituras, as melhores foram “Crime e Castigo” (Dostoiévski), “O Estrangeiro” (Albert Camus) e “O Jardim das Aflições” (Olavo de Carvalho).
4 - Viagens: em um aspecto 2011 foi imbatível: o ano em que mais viajei. Em fevereiro passei nove dias de férias em São Paulo; em abril fui a Porto Alegre; no mês de setembro fiquei uma semana no Rio de Janeiro para fazer a prova e a entrevista do mestrado; em outubro compareci pela 4ª vez seguida à ANPOCS, em Caxambu; uma semana depois fui novamente para a capital de SP, desta vez para o Planeta Terra.
1. São Paulo, parte I: talvez a única viagem que foi abaixo das minhas expectativas. Por mais que o casal de amigos que me hospedou sejam pessoas legais, ainda assim aqueles 9 dias não foram tão bacanas quanto eu esperava que fosse. Em alguns momentos, foram até meio entediantes... A D. quase nunca puxava conversa; eu me sentia invisível, e parecia até que eu não era bem-vindo, rs. Ainda bem que trouxe livros para ler (terminei um de ensaios do Rosenfeld sobre Thomas Mann, reli “Uma estação no inferno” do Rimbaud e li pela metade “Às Avessas”, do Huysmans) e DS para jogar (zerei “Pokémon White”). Pelo menos dava para conversar com o F. sobre futebol, videogames ou música; por sorte ele é palmeirense e fã da Sega, e naquela semana foi lançado o novo disco do Radiohead, o que já nos dava pelo menos três assuntos para conversar. Os dois primeiros dias foram até bons: na sexta 16/2, saímos com um casal de amigos deles; no sábado, fomos para um churrasco na casa destes amigos e mais alguns colegas deles, e só fomos embora no domingo, depois do jogo Mogi-Mirim x Palmeiras, hehe. A semana, contudo, foi chata; as coisas só melhoraram no meu penúltimo dia (23/Fev), quando fui à Galeria do Rock e comprei uma camiseta dos Pixies e cinco CDs: “Substance 1987” (New Order), “Different Class” (Pulp), “458489 A Sides” (The Fall), “The Idiot” (Iggy Pop) e “The Singles Collection” (The Kinks).
2. Porto Alegre: como eu disse no tópico 1, estes foram quatro dias maravilhosos. Nunca comi tão bem, nunca gastei tanto dinheiro e nunca conheci tantas pessoas legais em tão pouco tempo. O II Seminário de Economia Austríaca foi sensacional: palestras fantásticas, conheci gente de todo o Brasil e comprei vários livros. Na noite de sábado, fui com o pessoal a um rodízio (de fato, o churrasco gaúcho é excelente!), e acordei cedo para ver Fórmula 1 (como sempre, o Vettel venceu, rs). Os dois melhores momentos do XXIV Fórum da Liberdade foram justamente na primeira e na última mesa-redonda: aquela contou com os irreverentes Lobão e Eduardo Bueno; esta se destacou pelas boas perguntas que o debatedor Hélio Beltrão (fundador do Mises Brasil) fez aos palestrantes Marcelo Tas, que é um chatinho bem "pensamento classe-média", e Marcelo Madureira, o qual, pelo contrário, me surpreendeu com sua modéstia.
3. Rio de Janeiro: prova e entrevista de mestrado, e alguns passeios pela Cidade Maravilhosa. Vide este post.
4. Caxambu: no quesito "vida social e festas", após três ANPOCS tão animadas e cheias de emoções, a desse ano foi bem morna. Veio bem menos gente que nas edições anteriores, tanto no ônibus do pessoal de POL e REL da UnB quanto do público em geral. Só houve uma festa ao invés de três, mas pelo menos tocaram boas músicas nela - rolou desde "Blue Monday" (New Order) até "Bichos Escrotos" (Titãs)! Porém, no quesito "acadêmico", esta ANPOCS foi imbatível. Foram tantas mesas-redondas, GTs e conferências interessantes que preenchi quase trinta páginas do meu bloco de anotações. Gostei de ver que a Teoria Política e a Sociologia da Literatura são áreas que contam com bons estudiosos.
5. São Paulo, parte II: Planeta Terra. Vide este post.
Vamos dar uma guinada neste post, e operar uma breve reflexão.
2011 foi uma grande e deliberada nostalgia de 2005. Celebrei vários momentos daquele que provavelmente foi o ano mais importante da minha vida, tanto no âmbito político (esquerda democrática -> direita libertária) quanto no musical (comecei a ouvir a maioria esmagadora das minhas bandas prediletas: Blur, Pixies, Joy Division, The Smiths, Sonic Youth, My Bloody Valentine etc.), social (apaixonei-me pela 1ª vez desde 2000, fiz várias novas amizades, tive um ótimo 1º ano de ensino médio) e literário (li autores como Nietzsche e Dostoiévski e obras como “1984” e “Admirável Mundo Novo”).
Talvez este paralelo entre os dois anos ajudou meu 2011 a ter um ponto de referência, tanto para se inspirar quanto para se diferenciar. De fato amadureci nos últimos seis anos, mas meus paradigmas culturais, políticos e filosóficos (ou, para juntar tudo, existenciais) continuam praticamente os mesmos. Em outras palavras, é como se eu fosse o mesmo Kaio, só que “better shaped”. Não tenho mais tantas angústias e dúvidas quanto tinha aos 15 anos, mas sou tão idealista e auto-confiante quanto era naquela época. É como se a parte ruim tivesse ficado para trás, só restando o que de bom cultivei em 2005.
Eu sei que esse meu otimismo soa piegas, mas de fato vejo de forma positiva a minha transição da adolescência para a, digamos, maturidade (afinal, ainda preciso trabalhar, casar-me e ter filhos para começar a falar em "fase adulta", rs). Minha vida não é perfeita, mas dentro das possibilidades está muito boa. Talvez eu seja um anti-Cândido: por mais que tudo à minha volta (desde os livros que leio - tenho um fascínio estético por autores soturnos, rs - até grande parte de meus amigos e colegas) tente ver as coisas pelo lado sombrio e negativo, cada vez mais adquiro a convicção de que vivo no melhor dos mundos possíveis. Talvez seja muita precipitação de minha parte dizer uma coisa dessas aos 21 anos de idade; mas, pelo menos até agora, não tenho motivos para ver a minha existência com amargura e tristeza.