Sobre a crise em São Paulo
Uma coisa que fico indignado é o tratamento que muitos dão aos presidiários, chamando-os das piores palavras possíveis e os tratando como animais irracionais. É um erro gigantesco, pois, Independente de serem criminosos, os ditos "bandidos" são seres humanos, como eu e você. Eles não merecem a nossa falsa piedade, e muito menos o nosso desprezo. Eles não querem, acima de tudo, a nossa indiferença - essa vontade deles de chamar a atenção do "cidadão comum" é um dos motivos que os levam a transgredir as regras. Prova disso foi o fato de terem cometido crimes até bobos, como queimar ônibus. O Estado está pouco se lixando para isso - qualquer coisa, a alta carga tributária será utilizada para repor a frota. Quem realmente se ferra com isso é o José, o Tobias ou a Maria, que precisam trabalhar, e estão ralando para sobreviver nessa "selva asfaltada" que é o Brasil.
O diálogo com os líderes do tráfico pode parecer algo utópico, mas é também ilusão achar que basta botar o Exército para reprimí-los que a coisa será resolvida. Nada disso. A situação é crítica, mas não a tal ponto que seja preciso jogar tropas militares de alto escalão nas ruas de São Paulo. Aliás, já estão sendo feitos alguns acordos para resolver a crise, baseados na famosa passividade e permissividade que reinam no Brasil - afinal, 115 mortos e já se considerar o ocorrido uma guerra civil é foda. Dizemos isso porque não somos Ruanda em 1994, EUA na Guerra de Secessão, França na Revolução Francesa, ou mesmo o tal do "O Haiti não é aqui". No Brasil, como sempre, tudo acaba tão rápido quanto começou - não somos um povo bélico; só funcionamos com ditaduras, com alguém nos mandando fazer algo, porque, por conta própria (entenda-se 'democracia'), somos incapazes de nos virarmos. Afinal, em um país em que Getúlio Vargas foi o melhor presidente, algo está errado. Se demoramos 430 anos para alguém tomar o poder e resolver fazer alguma coisa, fica claro que realmente somos um povo bem mixuruca.
A mídia, como sempre, "aumentou" a história - William Bonner deixou a imparcialidade de lado e se exaltou, só para ficar no exemplo do Jornal Nacional. Se fosse no RJ, MG ou mesmo no fim do mundo (vulgo Goiás), a repercussão seria bem menor. O problema é que estamos falando de São Paulo, "a metrópole", como se esta fosse uma cidade tão melhor do que as outras. Ledo engano. O fato de ter 18 milhões de pessoas não a torna mais importante que o resto do país. E adiantou fazer todo esse alvoroço sobre a situação em SP? Foi feito algo para prevenir novas revoltas e resolver as injustiças sociais, ao invés de medidas a curto prazo? A resposta todos nós sabemos muito bem...
Alguns dizem que, com tudo isso, a candidatura do Geraldo Alckmin está sepultada. Será mesmo? Ops, já me esqueci... e o mensalão? Alguém se lembra? Pelo que dizem as pesquisas, com o PT na frente, não. E agora não será diferente. Basta o ex-governador de SP ser menos otário e vago e que passe a fazer um marketing pessoal e político melhor que ele pode dar trabalho nessa eleição. O pior de tudo é ver o Lula fingindo não querer tirar proveito da situação para se colocar como o "salvador da nação", o homem com pulso firme. Sem falar na guerrinha de interesses entre azuis e vermelhos... É incrível como esse pessoal consegue enfiar politicagem em tudo...
Retornando à discussão do determinismo x livre-arbítrio, minha posição é a do "um pouco de cada um". Participar do crime organizado é uma escolha, e também uma imposição - em outras palavras, o favelado é levado a isso, mas resolve continuar adiante porque sabe que não tem nada a perder: se morrer, tudo bem, ninguém liga mais pra ele, pois ele é só mais um excluído pela sociedade. Se sobreviver e ter sucesso, excelente, vai ganhar dinheiro e ter poder. Ele podia ter feito outra coisa ao invés de roubar? Claro! Ninguém o está impedindo de ser, por exemplo, jogador de futebol, rapper, escritor, etc. Assim como ele poderia não ter capacidade para mudar o seu destino, e aceitaria o que o meio o direcionou.
O que eu concluo de tudo isso? Nada. Isso mesmo, nada. As rebeliões não foram nenhuma novidade para mim. Pelo contrário, eu até achei que demoraram demais para ocorrer, levando em conta a opressão que sofrem os presos e marginalizados pela sociedade. A indignação foi se acumulando com o tempo, até que chegou-se a uma situação insustentável, na qual era necessário haver mortes, violência, conflitos. Não é uma luta de classes, mas também não é algo desprezível. É sim um alerta para os indivíduos e para as instituições. Infelizmente, revoltas como essa voltarão a se repetir de tempos em tempos, só que nunca em caráter revolucionário ou realmente a ponto de mexer com as estruturas sociais, afinal, meu caro, estamos falando do Brasil.