The Idiot, o primeiro disco solo de Iggy Pop, chegou às lojas no dia 18 de Março de 1977. Quatro anos desde o último álbum do Stooges, Iggy voltou à cena musical novamente sob produção de um de seus discípulos: David Bowie (que já havia produzido Raw Power, dos Stooges). O disco foi gravado na França e principalmente na Alemanha, onde ambos estavam "exilados" da atmosfera hedonista de Los Angeles, inclusive para se desintoxicarem de seus respectivos vícios: Pop, da heroína; e Bowie, da cocaína.
David ajudou Iggy a recuperar a auto-confiança e escreveu em parceria com ele todas as músicas do álbum; aliás, duas delas entrariam no seu repertório: "Sister Midnight" (mas com uma nova letra e um novo título, "Red Money") e "China Girl".
O título do disco foi inspirado no romance O Idiota (Dostoiévski), do qual ambos - além de Tony Visconti, produtor de Bowie - gostavam.
Embora tenha sido gravado antes de Low, The Idiot foi lançado dois meses depois. Talvez Bowie não quisesse que o público pensasse que Iggy Pop o tivesse influenciado em sua guinada para um estilo mais impressionista, um art rock marcado por experimentos com música eletrônica... mas, de fato é como se Iggy fosse uma cobaia do que David pretendia para a sua futura "trilogia de Berlim". De toda maneira, ainda naquele ano Lust for Life (Iggy) foi gravado e lançado antes de "Heroes" (Bowie). Com isso temos quatro dos melhores discos de 1977 - e de toda a história do Rock.
Das cinco faixas do Lado A de The Idiot, quatro são clássicas. "Sister Midnight" tem uma letra edipiana e um ritmo lento e pesado, conduzido pelo baixo de George Murray e pelo riff de guitarra peculiar de Carlos Alomar.
Introduzida por uma bateria eletrônica (que 17 anos depois será sampleada para o início de "Closer", do Nine Inch Nails), a soturna "Nightclubbing" trata do estilo de vida decadentista do qual seus autores há pouco participavam: "Nightclubbing we're nightclubbing / We're what's happening (...) We're an ice machine / We see people brand new people / They're something to see (...) We're walking through town (...) We walk like a ghost / We learn dances brand new dances / Like the nuclear bomb". A propósito, ela está na trilha sonora do filme Trainspotting (junto com outra grande canção de Iggy, "Lust for Life").
"Funtime" segue a mesma temática, mas também é uma continuação de "No Fun" (Stooges) - vide versos debochados como "I don't need no heavy trips (...) I just do what I want to do / All aboard for funtime" - e tem um final eletrizante e perturbador, em parte inspirado pelo krautrock alemão.
O quarto clássico é "China Girl", cuja letra pode ser tanto sobre uma garota vietnamita de que Iggy gostava na época quanto uma alusão à heroína ("china white" era uma gíria para esta droga). A versão de Bowie lançada 6 anos depois tem um arranjo mais pop e é mais famosa, mas prefiro a original, que tem mais dramaticidade.
O não-clássico do Lado A é "Baby", mas mesmo assim é uma boa canção. Quanto ao Lado B, temos uma faixa sobre groupies adolescentes ("Tiny Girls") e outras duas obras-primas: "Dum Dum Boys", um longo e contundente rock no qual Iggy fala de forma nostálgica de seus colegas de Stooges; e "Mass Production", uma das canções pioneiras do rock industrial, e que ao longo de oito angustiantes minutos fala de relacionamentos descartáveis: "Before you go / Do me a favour / Give me a number / Of a girl almost like you / With legs almost like you / I'm buried deep in mass production / You're not nothing new (...) Yes, she's almost like you / And I'm almost like him".
Uma curiosidade macabra sobre The Idiot é que ele foi o último álbum ouvido por Ian Curtis antes de cometer suicídio; o LP estava tocando em sua vitrola quando seu corpo foi encontrado. A propósito, não só o Joy Division, mas também outras bandas post-punk como Siouxsie and the Banshees e Bauhaus foram profundamente influenciadas por este disco, em particular pelo uso de sintetizadores, a proeminência do baixo e da bateria e as letras sombrias e reflexivas. The Idiot é o melhor disco de Iggy Pop (seguido de perto por Lust for Life e pelo recente Post Pop Depression), embora destoe da verve mais punk do resto de sua discografia.