Now she's on purple, now he's the turtle
Quanto a Júlia, ele sabe bem o que fazer: nada. No máximo, manter as conversas triviais, afinal ambos adoram dialogar sobre coisas inúteis e aleatórias, embora travestidas de cult. Os livros de Teoria Política (ele) e História Econômica (ela) que haviam comprado na semana passada, o novo álbum do Muse, as novidades sobre a turnê do Franz Ferdinand em Cosmopólia, qual filme assistir no cinema, o que escrever para a próxima aula de Oficina Literária etc.
Tocar no assunto "strawberry girl", no entanto, estava fora de questão. Não que Júlia se sentisse mal em falar dela, mas porque havia um clima sutilmente tenso entre os regressos da viagem. Embora tenha parado de brigar com Henrique, Cristine ainda não tinha obtido uma reconciliação completa com ele e outras pessoas: Manuela, Ingrid, Fábio... Aliás, a própria possibilidade de falar sobre 20 pessoas diferentes na mesma conversa desencorajava César de sequer mencionar essa temática! É claro, no entanto, que não via a hora de essa situação estranha se encerrar.
Ok, evito falar sobre ela com o César, mas me sinto na necessidade de entender o enigma que é Cristine. Temos tantas semelhanças e diferenças que não custa nada enumerar, com um top 5 para cada (juro que a pessoa viciada em listas dessa história não sou eu! É apenas para demonstrar uma teoria, tudo bem?).
S5 - Não nos damos tão bem assim com nossas respectivas famílias, emboras os motivos - e a maneira como lidamos com isso - sejam bem diferentes.
S4 - Achamos que o César, embora tenha idéias bacanas, possui uma retórica fraca, e precisa desenvolver melhor sua capacidade de filosofar se quiser ganhar alguma discussão mais profunda e/ou não parecer prolixo e raso.
S3 - Ela, assim como eu, é alta, magra, de pele branca e cabelos escuros. De quebra, também vive com a neura de que está gorda.
S2 - The Smiths foi a banda que salvou nossas vidas, embora eu também dê crédito para os Pixies nessa redenção.
S1 - Fazemos Relações Internacionais, e ambas somos REL frustradas às avessas. Porém, eu amo Economia e Literatura, e ela quer fazer Sociologia.
D5 - Ela tem os colhões (?) para mudar de curso, enquanto eu me conformarei em tirar o melancólico diploma de, hã, internacionalista.
D4 - Sem querer parecer imodesta, mas sou emocionalmente mais estável que ela. Essa constância não necessariamente é algo maravilhoso, mas vocês não entenderiam por que.
D3 - Eu não acho que Blur é uma mera boy band sem graça (que heresia!), e ela não pensa que a MPB é um inferno repleto de gente chata, pedante e pretensiosa.
D2 - Ela é de esquerda e eu, de direita. Sendo mais detalhista, a Cristine faz a linha desconstrutivista/feminista/socialista utópica, enquanto eu sou uma liberal-democrata à moda antiga, e "Chicago girl". Como o César é libertário e simpatizante do individualismo de Hayek, Ayn Rand e Thoreau, nem preciso falar que havia divergências ideológicas sérias entre eles...
D1 - Por último, Cristine tem menos receio de demonstrar sentimentos por alguém, o que é uma faca do dois gumes, pois não é fria e introspectiva como eu, mas se expõe mais facilmente a decepções e hostilidades.
O César ia adorar uma lista desse tipo, como vocês podem imaginar. Foi de propósito, afinal eu sei que ele vai ler isso e se segurar para não falar - pelo menos explicitamente - sobre esse duplo top 5 comigo amanhã.
Cansei. Vou tomar um chocolate quente e ir para cama.