My Parklife
Tudo começou na sexta 16. Minha mãe, meu padrasto e meus dois irmãos caçulas foram viajar para o Sul (não, eles não são pássaros), especificamente para as praias de SC. Preferi ficar na casa dos meus avós paternos. No dia seguinte, convenci meu pai a me dar dinheiro para que eu fosse no shopping comprar meus presentes para o Dia Mundial do Capitalismo. Comprei dois livros ("O Idiota", do Dostoievski, e "Para Além do Bem e do Mal", do Nietzsche, sendo que eu já comecei a ler este último - felizmente, é mais fácil de ler - e compreender - que o "Assim Falou Zaratustra"), fones de ouvido novos e uma coletânea do Pixies, a "Wave of Mutilation" (caríssima, 41 reais, mas se tratando de Pixies eu nem me importei).
O domingo foi um saco, meu pai e minha madrasta foram a uma confraternização de fim de ano dos empregados da empresa de calçados em que meu pai trabalha. Uma putaria só, lotado de bêbados com péssimo gosto musical, tocou até funk. Na segunda, eu e meu primo fomos num sebo. Com 19 pratas, comprei um CD semi-novo dos Beatles, o "Past Masters Vol I" e uma edição antiga do "Admirável Mundo Novo" (já tinha o livro, mas adoro velharias). Na terça 20, fui no shopping investir um pouco do capital que a minha mãe tinha me dado antes de viajar. Comprei o disco duplo “The Wall”, do Pink Floyd, em promoção – R$ 39,90.
No dia seguinte, meu tio metido a empresário futebolístico e sua família foram comigo a um jogo de futebol beneficiente, entre os Amigos de Leonardo (aquele cantor sertanejo chorão) x Amigos de Fernandão (um jogador do Internacional que jogava no Goiás). O jogo foi uma merda. O dia valeu a pena porque, horas antes, eu fui no Wal-Mart recém-inauguarado em Goiânia, e consegui achar o “Best Of” do Blur. Gastei meus últimos 31 reais e 60 centavos com ele. Aliás, é da capa desse disco que eu tirei a minha foto do Yorkut, com a caricatura do Alex James, baixista do Blur.
A quinta veio, mais um dia de ócio. Na sexta, a mesma coisa. Na véspera do Capitalism Day, fui pela última vez no shopping (sim, tratei meu pai como um banco). Comprei o CD novo do Franz Ferdinand. Já tinha ouvido as mp3 dele na net, mas achei o álbum tão bom que decidi tê-lo. Destaque para as faixas “Outsiders”, “The fallen”, “You’re the reason I’m leaving”, “Do you want to”, “Walk away” e “This boy”.
Sobraram 20 reais. Eu pensei em comprar uma camiseta dos Beatles, mas ela já tinha sido vendida (ainda descubro quem foi o beatlemaníaco desgraçado que comprou ela antes de mim). Fui na livraria. Olhando pelas prateleiras, procurando algum livro de filosofia que salvasse a minha vida do tédio, vi o livro “On the Road”, do Jack Kerouac. Me lembrei das boas resenhas que ele levou por sites afora. Não tinha nada a perder, e o obtive.
O fim de semana foi horrível. Meu pai e minha madrasta foram comigo para uma chácara de parentes dela. A comida da “ceia natalina” estava péssima, as crianças eram irritantes e mimadas, os adultos não passavam de bêbados metidos a engraçadinhos. Meu lado anti-social prevaleceu, e eu resolvi me isolar no quarto, e tentar dormir mais cedo (trocadilhos à parte, a música que eu mais ouvi nos últimos 10 dias foi “Isolation”, do Joy Division). Como diria Graham Coxon na letra de “Coffee & TV”, ‘sociability is hard enough for me’.
Acordei no domingo com um péssimo humor, não queria falar com ninguém. Decidi ler o tal do “On The Road”. Lembram-se que, no início do post, eu falei que um livro salvou meu fim de semana? Pois bem, é esse mesmo. Ele é tão fenomenal que acabou com minha ‘ressaca literária’, que já durava 6 semanas. Ou seja, há 1 mês e meio eu não lia mais de 30 páginas de um livro. Aliás, com o “On The Road” foram bem mais do que isso. Agorinha, quando eu dei uma pausa na leitura, já estava na pág. 182.
O livro é um relato com toques de ficção do escritor Jack Kerouac sobre os seis anos que ele passou na estrada. Os personagens vivem viajando atrás de diversão, querem apenas viver a vida, sem preocupações. São movidos por sexo, aventura, espontaneidade e companheirismo. O livro é considerado a bíblia da geração beat, e influenciou todos os movimentos culturais e artísticos que mudaram o comportamento da juventude na segunda metade do século XX, com o rock, os hippies e até os punks. Jim Morrisson, após ler a obra, fundou o The Doors. Beck decidiu virar cantor. Bob Dylan fugiu de casa. E por aí vai.
Mas é até justificável. “On The Road” foi feito numa prosa espontânea, e passa uma enorme sensação de liberdade, independência e alucinação. Um autêntico ‘do it yourself’. Uma esperança para que quem o leia realize seus sonhos e projetos. O livro realmente me animou, eu estava mal até ontem, até me sinto melhor após começar a leitura dele. Realmente dá uma vontade de fazer como os protagonistas, Dean Moriarty e Sal Paradise, e botar o pé na estrada.
Quem me dera se mais pessoas lessem o livro. Chegamos a um momento em que algo precisa ser mudado. A juventude atual é comodista, conformista e alienada demais. Levam uma vida sem graça. Ganharam a liberdade sexual, mas parecem não ter nenhuma perspectiva de vida, vão simplesmente seguir o caminho traçado, gostar das porcarias radiofônicas, não desejar mudanças políticas (e, quando desejam, caem nas garras do comunismo hipócrita,.e viram os ‘socialistas de Nike Shox’).
Eu não quero mudar o mundo. Minha revolução será individual, e não coletiva. Deixo isso pros comunas. Apenas quero encontrar pessoas com quem eu tenha prazer de ter a companhia. Viver no underground, ouvindo meus discos de Rock alternativo, lendo Nietzsche e conversando com meus amigos. E só.