Modern Life Is Rubbish, segundo álbum do Blur, foi lançado há exatos 30 anos, em 10 de Maio de 1993. Após dois anos bastante tumultuados (retratados no documentário Starshaped), a banda decidiu dar uma guinada estilística, compondo letras repletas de críticas sociais e melodias inspiradas em bandas de pop rock britânicas dos anos 60 e 70, como The Kinks e The Jam. Essa mudança estética já havia sido antecipada na combinação de ritmo punk e naipe de sopros em "Popscene", single lançado em Março de 1992.
Modern Life foi uma espécie de manifesto artístico, pois contém todos os elementos do que viria a ser chamado de Britpop, movimento de renascimento das tradições musicais do Reino Unido em reação ao rock alternativo americano, em particular o grunge. O Blur convidou Andy Partridge (vocalista e guitarrista do XTC) para produzir o álbum, mas após algumas divergências acabaram trabalhando com Stephen Street (que foi outra figura chave da música britânica, já que era o engenheiro de som e eventualmente produtor dos Smiths).
O álbum não vendeu bem nos primeiros meses, não só porque o grunge estava no auge da popularidade mundial mas também porque outra banda britânica roubou os holofotes do Blur: o Suede, que já vinha de uma sequência de 3 ótimos singles e alcançou o 1º lugar das paradas com seu debut homônimo. Esse sucesso de certa maneira representava uma vingança de Brett Anderson sobre Damon Albarn, vocalista e letrista do Blur, que estava namorando a sua ex, Justine Frischmann.
Intrigas amorosas à parte, a crítica elogiou bastante Modern Life, e a turnê de 1993 deu à banda um impulso que seria consolidado com o próximo disco, Parklife.
Escrita durante o Natal de 1992 para ser o primeiro single do álbum (após o dono da gravadora reclamar que o disco não tinha nenhum hit em potencial), "For Tomorrow" é a faixa mais representativa da filosofia de Modern Life. Albarn revela o seu lado "sátiro social", à la Ray Davies (The Kinks), analisando as ansiedades diárias dos londrinos. A seção de cordas adiciona uma dimensão épica a esta música. O refrão “la la la” é extremamente pegajoso (no bom sentido), e a estrofe cantada como um “rap” no final explica o título do disco: “Jim stops and gets out the car (...) Then he puts the TV on / Turns it off and makes some tea / Says 'Modern life, well, it's rubbish'".
"Advert", do ponto de vista sonoro, remete às origens punk da banda; do ponto de vista lírico, é a primeira crítica social abertamente sarcástica do álbum (já que "For Tomorrow" tem um ponto de vista mais melancólico): "Advertisements are here for persuasion / If you stare too long you'll lose your appetite / A nervous disposition doesn't agree with this / You need fast relief from aches and stomach pains".
O tom sardônico persiste em "Colin Zeal", o primeiro dos personagens criados por Damon Albarn para satirizar os tipos sociais britânicos: "Looks at his watch he's on time yet again / He's pleased with himself (...) He's an immaculuate dresser, he's the common aggressor / He's a modern retard with a love of bombast". Ela talvez seja uma das faixas de Modern Life Is Rubbish que melhor evoca o que Mark Beaumont em uma crítica para a NME chamou de "olhar aguçado para o tédio da Grã-Bretanha pós-Thatcher".
"Pressure on Julian" é a primeira das faixas marcadas por um som psicodélico, principalmente na guitarra de Graham Coxon; esse estilo também ocorre na agressiva "Oily Water" e na letárgica "Miss America".
"Star Shaped", homônima do já mencionado documentário de 1993, é uma das joias pop da Modern Life. O solo de oboé é muito bonito.
A próxima canção, "Blue Jeans", é uma das melhores baladas compostas por Albarn. O refrão evoca um sentimento de conforto romântico: "She doesn't mind, whatever I say / I don't really want to change a thing / I want to stay this way forever".
Após a impecável sequência das primeiras nove faixas, a segunda metade do álbum é um pouco menos empolgante (embora "Villa Rosie" seja uma canção cativante). Isso é mitigado na edição americana de Modern Life, que contém três faixas bônus, duas das quais são excelentes: o single "Popscene" (que não entrou na edição britânica porque a banda estava chateada com seu fracasso nas paradas) e a hilária "When The Cows Come Home", lado B de "For Tomorrow".
Modern Life Is Rubbish criou o modelo não apenas para os próximos dois álbuns do Blur (Parklife e The Great Escape), mas também para a cena musical (Britpop) que dominará o Reino Unido no ano seguinte. Embora seja um pouco irregular, sua primeira metade é repleta de grandes canções que continuaram no setlist do Blur pelas décadas seguintes, dentre elas "For Tomorrow", "Advert", "Chemical World" e "Sunday Sunday".
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